A SOLIDÃO E OS ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO
De tanto insistir, a solidão termina sendo essencial ou o fim da linha. Não há meio termo. Como um espinho cruel e gigantesco, a solidão fura a alma até abrir espaço suficiente para o fluir abundante das lágrimas, mas ao longo dos anos, de tanto maltratar ela se torna parte integrante do existir ante a criação por ela mesma de mecanismos capazes de ameniza-la e fazê-la componente do todo humano.
Se bem não goste do isolamento, de estar longe de seus semelhantes, o ser humano se adapta, se molda e com ela se conforma a pouco e pouco. Porque em estando sozinho o homem descobre manias das quais a longo prazo já não consegue se livrar, agarrando-se a elas como se um arrimo ao qual se abraçar fosse, ser social que é. Então, nesse estágio em que estar sozinho virou pobre e inesperado hábito, ter alguém consigo não parece mais ser imprescindível, pois a solidão suplanta e mata o amor e acaba se bastando. Isso denota algo sobremaneira assustador para a perpetuação da espécie, principalmente nos tempos atuais em que as pessoas se afastam e se distanciam por meras banalidades.
Quem foge do afeto semeia a árvore da solidão, e esta, ainda que sofra por um tempo, forja raízes em derredor de si mesma e passa a depender unicamente de si mesma e seu ambiente. Termina esvaindo, assim, no deserto de seu eu magoado.
Ninguém ensina como sobreviver à solidão, inexiste manual para isso, ela própria se alimenta de sua tristeza inicial e, infelizmente, cria barreiras para afastar quantos tentem demolir suas muralhas. Solidão é ferida que dói, mas se ou quando cicatriza se transforma em fortaleza quase inabalável, então ataca e afasta os poucos que ousem derrota-la. Infértil ela é, cruel e auto suficiente após, com o seguir dos anos, fincar seus tentáculos feito pilares profundos e nunca mais sair do coração do solitário. O coração de muitos não mais acolhe humanos, somente pets. O amor trocou de roupa. Triste e trágico!