TE AMO, IARA(*)
Foste tu que me ensinaste a ler e escrever, através do anjo Expedita Almeida. Contigo aprendi a rezar e fiz minha primeira comunhão. Com o exemplo da tua persistência, no ano de 1958 tive as primeiras lições de como sobreviver com dignidade às adversidades da vida. Foi naquela famigereda seca que assolava o meu Ceará que aprendi com teu instinto de sobrevivência a conviver com a escassez de água e driblar com maestria a mortífera subnutrição. Contigo também passei tempos de fartura, tempos maravilhosos, bastava a água das chuvas encharcar teu chão para que eu, empanturrado de frutas e milho assado, corresse descalço em ti, montado num cavalo de pau, e meu coração transbordando de felicidade.
Sou teu filho por opção, escolher-te como mãe adotiva foi a melhor das minhas decisões, mas, seguindo a vida nômade do pai, o infante caiu no oco do mundo te deixando para trás. Cresci sem muito me importar com tuas dores e tuas necessidades, jamais pensei em te embelezar, te comprar um vestido novo ou te visitar nos natais. Algumas vezes te visitei anonimamente, somente para matar a saudade, sentir teu cheiro e tomar a bênção de Nossa Senhora da Conceição.
Sei que você está envelhecida pelo tempo e alguns imediatistas acreditam que demolir teus prédios históricos, apagando tua memória, seria a melhor solução. Quando tomei conhecimnto de tais aberrações, meu amor dantes adormecido aflorou. Foi aí que senti na alma a dor que você iria sentir sendo amputada gratuitamente. Tirar pedaços de ti, da tua história, é tirar pedaços de mim. Eu te amo, mãe Iara, te amo incondicionalmente, mesmo sendo um filho ingrato, um filho ausente.
(*) Iara: Distrito da cidade do Barro (CE)
Autor Benedito Morais de Carvalho (Benê)