Os Invisíveis.

 

É comum caminharmos pelas ruas e passeios, e, principalmente no nosso ambiente de trabalho, e não os perceber, simplesmente não os vemos. Uma amiga, a qual muito estimo e considero, contou-me uma situação que aconteceu com ela sempre que voltava da casa de sua mãe para a dela. Um trajeto não muito longo, porém, o fazia diariamente durante um período que lhe coube cuidar da casa enquanto os pais estavam ausentes. Sempre que passava ao lado de um supermercado, havia um morador de rua que a cumprimentava, dando-lhe bom dia ou boa noite, conforme o tempo, ao que ela respondia em conformidade. Certa vez, próximo ao anoitecer, caia uma chuva fina e persistente, ela desejou-lhe, como de costume, o trivial boa noite. Para sua surpresa, ele não apenas retribuiu como também, acrescentou um inigualável, e, inesperado, bom retorno para casa!

 

Relatou-me ela, que, a saudação seguida do desejo por ele enviado, fora de forma tão verdadeira e cativante, de uma simplicidade e profundidade deveras marcante, que a consumiu ao longo do caminho envolta a uma autoanálise a respeito de nossa condição de colocar a vida no automático e não darmos conta de quantos não tem para onde retornar. Estão sempre no mesmo lugar, ou ainda menos agradável, sempre indo sem poder voltar. Ninguém os espera. E ao longo do dia, passamos por colegas de trabalhos, servidores em cargos menos expressivos nos corredores dos supermercados, lanchonetes, bancos, e não os notamos, tornam-se invisíveis, simples assim.

 

Marco Aurélio, imperador romano e um expoente da escola Estoica, dizia que todo ser humano é único e tem seu valor e importância tal, que sua morte é algo que não tem comparativo do ponto de vista daquilo que deixamos de aprender com ele. Sua experiência de vida não mais é acessível e nunca saberemos o que ele soube. Donde a unicidade do compreender o outro, do perceber a individualidade do outro, sua forma de encarar a vida, a mesma que dividimos diariamente, cada um em sua fase e compreensão, não teremos mais acesso e foi levada com seu passamento.

 

Perder oportunidades em conhecer, apenas por não perceber que todos somos importantes e que nossa posição é apenas diferente e não superior ao do próximo, é desconhecer a nós mesmo.

Por quantos invisíveis passamos ao longo da vida?

 

 

em tempo: já senti a invisibilidade em algumas reuniões.