A árvore teimosa

Na rua onde eu moro tem uma árvore. Árvore comum, com tronco, folhas, galhos e, ocasionalmente, flores. Acho que são flores amarelas. Não sei o nome, a família ou a região de origem da espécie. Não sei quem plantou nem quando. Só sei que ela se deu bem no local. Quer dizer… Os passarinhos gostam. Imagino que outros bichos também, tipo insetos, morcegos e calangos. Quem também gosta dela são dois tipos de gente: os motoristas, que disputam sua sombra, e as crianças da rua, pois ao redor do seu tronco fazem suas brincadeiras, reuniões, intervalos para decidir qual o próximo jogo, entre outras decisões importantes para a criançada.

Alguém na vizinhança não gosta dela. Vai saber a razão: implicância, má vontade, trauma com árvores — isso existe? —, desinformação, deformação do senso estético e outras explicações científicas, metafísicas e culturais. Se você souber de outros motivos que podem levar as pessoas a não gostarem de árvores, diga, agradeço sua contribuição.

Minha desconfiança baseia-se nas sucessivas tentativas de corte, mutilação e hostilidades sofridas pela árvore. Só que eu não vou contar de quem eu suspeito, não quero brigas com os vizinhos. É bem verdade que a companhia de eletricidade vira e mexe aparece para podar sua copa. Trata-se de uma contenda antiga, uma eterna briga entre os galhos e a fiação. Acho que a árvore está perdendo a queda de braços, isto é, de galhos. Enfim, fora outras questões de ordem socioeconômica, o país só vai ser chamado de “nação desenvolvida” quando essa briga cessar. E a vencedora for a árvore, é claro. Não tem sentido uma cidade cheia de fios pendurados a torto e a direito, desfigurando a paisagem, trazendo riscos aos pedestres. Sabia que já existem lugares com a fiação toda subterrânea? Conhece as placas fotovoltaicas? Ou seja, soluções existem.

Mas não só de escaramuças entre fios e galhos vive a árvore. Alguém deseja seu fim e age na calada da noite. Uma manhã, fui caminhar nas redondezas e me deparei com a árvore lascada, o tronco ferido. Fizeram um corte circulando todo o diâmetro do tronco, ou seja, com a clara intenção de interromper o fluxo de seiva entre a parte aérea e as raízes. Foi intencional, não tenho dúvidas, foi um atentado. Não sei como, mas a árvore se recuperou. Pensei que seria seu fim, mas ela resistiu.

Outra agressão foi o corte radical de seus galhos. Ficou só o tronco, uma imagem triste, desesperada, uma figura horrível. Os braços levantados como se pedisse socorro. Mais uma vez, ela se recuperou. Ataques diversos já aconteceram, como sufocamento, envenenamento, fogo etc. É por isso que dei a ela o apelido de Árvore Teimosa. Infelizmente, não se trata de caso isolado. Até quando ela vai teimar? No meu caso, espero seguir com esperança na vida, teimoso como a árvore da minha rua.