UM ANO VAI... OUTRO VEM

Poucos dias para o encerramento do ano e eu volto a lembrar-me de uma frase que sempre me persegue, não quando aniversario, mas sempre que chega o final do ano: o que vou viver daqui para frente será, sem sombra de dúvidas, menor do que já vivi para trás. E isso me entristece. Não pelo fato em si, biológico, de matéria, mas pelo fato de que mais um ano se vai e eu não consegui cumprir com um décimo das promessas feitas, nem realizei um quinto dos projetos planejados.

Tem também o lado sentimental. Nesse período do ano fico melancólico, menos alegre, mais discreto, menos brincalhão. Essa data, apesar de ser festiva, não me traz motivos para isso. Para começar, nós nos lembramos de tudo: comprar roupas novas, dar presentes, comemorar com parentes, beber e comer a vontade, passear, viajar, mas esquecemos justamente do principal: de convidar o aniversariante dono da festa para se fazer presente nas nossas festividades. Em muitos lugares em que se comemora o natal, ele não entra. Fica esquecido. No máximo, um presépio. E olhe lá.

E isso é fácil de notar, pois a cada ano que passa menos se preserva as tradições religiosas. Muitos não sabem qual o verdadeiro sentido do natal e poucos mantém o costume de reverenciar a data como sendo o marco da vinda do Criador para habitar entre nós.

E é aí que reflito sobre a ilusão da vida. Observo a cada dia que passa os valores éticos serem substituídos por efemeridades; modismos que se tornam padrões de condutas e que nos levam as banalidades do consumo exacerbado e frívolo, ditado, principalmente, pela indústria do “ter”, em detrimento da beleza do “ser”, tão respeitado por nossos antepassados e ainda por uns poucos de nós.

Por isso, nessa data me faço humano e tento compreender o ano que se vai. Relembro o que aconteceu; o que fizemos; o que deixamos de fazer; as obras de caridade que prestamos; os “não” que dissemos aos necessitados; a desculpa para negar o telefonema pedindo uma ajuda, enfim, passam em filmes os doze meses e eu me pego em penitência com meus remorsos naturais.

Mas, final do ano não é só isso. É também a chegada das férias para muitas das profissões que exercemos em nossas vidas. O professor, por exemplo, anseia por essa data. Ele, principalmente, sabe o valor do final do ano letivo: o diário revela, detalhadamente, sua contribuição para o progresso futuro de sua nação. Embora, nos últimos anos esteja difícil ter tantos motivos para se pensar num país melhor para o amanhã. Mas, dizem que a esperança é a última que morre. A caixa de Pandora é testemunha.

Final de ano também serve para renovarmos nossas promessas para o ano que vai entrar. Pelo menos temos a ilusão de que ainda falta um ano para que elas sejam cumpridas: tempo suficiente para que as mudemos várias vezes ao longo dos meses e tempo mais do que necessário para quando chegar ao seu final, concluirmos que mais uma vez apenas quisemos nos enganar. É sempre assim. Promessas são feitas para não serem cumpridas, metas para não serem alcançadas. A maioria pensa e age assim. Infelizmente. Mais um ledo engano.

Além disso, o ano é também de balanço pessoal. O equilíbrio da balança imparcial do seu ser absoluto, verdadeiro, sem mácula, lhe passa o relatório dos seus créditos e dos seus débitos de uma forma fidedigna, com a autenticidade carimbada pela sua índole e caráter: saber onde errou e o mal que causou; as boas ações praticadas que lhe renderam bônus e um pouco de respeito; os degraus que galgou e o sentido que isso representou na sua vida profissional.

Por fim, o ano é também para se avaliar o coração. Saber das perdas naturais, onde o trem faz a última parada e dele desce alguns amigos que por lá ficam a espera do ônibus que os levarão para suas novas moradas; dos amores perdidos e dificilmente recuperados, muitos por um simples gesto que os leva a quebrar o encanto, a magia; a dor da saudade pelos versos molhados em lágrimas de quem chora a distância e a falta do carinho e derrama no coração do poeta que lê os poemas, conflitos existenciais homéricos, por não encontrar a resposta para aliviar o sofrer de quem nasceu para encantar com seu versejar. E assim se vai o ano, se finda um período, se acaba um ciclo. E aí? Aí se começa tudo de novo.


 
Obs. Imagem da internet

Raimundo Antonio de Souza Lopes
Enviado por Raimundo Antonio de Souza Lopes em 30/12/2007
Reeditado em 04/12/2011
Código do texto: T797064
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