Visita inesperada
Ah, vida! Gosto demais quando me oferece visitas inesperadas. E não falo sobre parentes sem noção que nos visitam sem hora para ir embora ou mesmo sem nem sequer um convite ou um aviso de antecedência. Simplesmente tocam a campainha e me encontram desprevenida. Também a pessoas e situações indesejadas, que chegam sem hora marcada e tiram toda minha energia. O tipo de visita inesperada que gosto é como o dia que um passarinho entrou pela janela do meu quarto, que uso como escritório. Ele chegou tão delicadamente e sem fazer nenhum alarde, enquanto eu distraidamente fazia terapia. E ficou ali parado, como se educadamente esperasse eu terminar. Mesmo que seu voo, seja por instinto, mais urgente do que o que eu compartilho na sessão, uma vez por semana.
Quando a sessão foi encerada e fui pouco a pouco voltando para o momento presente. Levantei da poltrona, abri a porta, então só depois notei sua presença. Ainda ficou um tempo parado, como a observar o que aconteceria, quais seriam meus próximos passos. Para nós dois, tudo era novidade e surpresa. Um espanto mútuo. Só após esse primeiro reconhecimento, ele deu para bater as asas e voar por todo cômodo. Pousou suavemente na estante de livros e ficou por ali um tempo, como a contemplar o ambiente. Alheio aos meus pedidos, que ele tomasse o rumo de volta, saindo pela mesma janela ampla que ele entrou. Mas naquele dia, ele parecia não ter pressa. Ou tenha entrado por ali tão acidentalmente, que por alguma razão entendeu que não havia uma saída. Aquele cenário havia se materializado, como uma passe de mágica, para nós dois. Afinal, um passarinho como aquele, voando pelo meu escritório, era um momento igualmente mágico para mim.
Depois o voo começou a ficar mais urgente. A impaciência se instalando dos dois lados. Ele precisava sair dali, eu precisava que ele saísse. Ele não encontrava a saída, eu não tinha a coragem e suavidade necessárias naquele momento para indicar o caminho certo. Seria tão lindo se eu tivesse. Se o colocasse envolto em minhas mãos, de tal forma que ele se sentisse seguro. Desse tempo para ele se acostumar com aquele toque novo, que ele pudesse se recuperar do susto de existir. Afinal eu sei como é esse suto. E toda sexta, naquela sessão, eu me deparo com tantas coisas. Que seria tão lindo receber esse acolhimento suave até que eu pudesse me reestabelecer.
Eu não fui capaz deste ato. Por puro medo, do seu bater de asas, de sua ânsia por liberdade, pelo seu voo confuso. De modo que tive que chamar uma outra pessoa, que felizmente mostrou-se apta para tal resgate. E ele ficou sã e salvo. Pronto para próximas aventuras, cenários e caminhos. Que os dele sejam sempre livre e amplos e nunca restrito a um único cômodo estranho.
E eu, agradeço demais ao Universo, a essa visita inesperada, mesmo tendo ficado toda atabalhoada.