Posso não gostar do verão?
Vi uma notícia que simplesmente me abalou: O calorão que estamos vivendo desde o mês de setembro irá se prolongar até abril de 2024. Ou seja, o El Nino veio com tudo e, claro que o Brasil vai sofrer muito com isso. Até quem morre de amores pelo verão já está reclamando. Imagine eu, por exemplo que sempre amei uma brisa fresquinha, uma garoa gelada, um orvalho caindo na madrugada, um cenário cinzento com direito a estalo de folhas secas no chão, parece que será adiado.
Permitam-me: Posso ter o direito de não gostar do verão?
Meu marido quer ir a praia antes do final do ano. Eu também fiz planos pra isso mas, só de pensar aquela praia cheia com o sol queimando meus ombros, parece que ativa e aumenta em três vezes os meus pés de galinha. E, sentir aquele cheiro enjoativo do protetor solar? Nossa! Percebo a quilômetros quando alguém está chegando banhado por aquele creme.
Mas, ainda assim eu queria ir a praia sim. Em dia ensolarado e fresco onde eu pudesse caminhar por horas à beira mar, sentir meu pés afundando na areia mas sem o desespero do "Preciso sair rápido do sol ou vou virar um camarão?" Queria usar um chapéu bem romântico e uma saída de praia branca, leve e elegante. Apreciar a calmaria do mar, o barulho das ondas, enquanto tomo sem pressa nenhuma minha água de coco geladinha. Observar a praia vazia e sentir aquele silêncio na mente e na alma. Sabe aquela coisa de querer distinguir os sons? Tipo o som do vento, mar, gaivotas e, resumindo: Queria ter meu dia de "Helena, do Manoel Carlos". Quem nunca, não é mesmo? Mas a realidade é bem diferente e, sei que não teremos dias tão fresquinhos, assim não.
Também não sei se conseguirei escrever outro livro. Isso é muito sério... Eu só tenho inspiração no tempo frio. Todos os meus quatro livros foram escritos em dias frios e chuvosos. O verão nunca foi um banquete para minha inspiração. Ainda que existam barquinhos, ondas, peixinhos, sol se pondo no horizonte. Nada disso me inspira a escrever. Não sei que brasileira sou eu, que não gosta de verão pois, não me sinto tropical. Minha alma deve ser européia porque não é possível alguém como eu ter vergonha de ficar, por exemplo, deitada me bronzeando na areia. Uma coisa comum mas, detesto isso! Acho que jamais colocarei o bumbum pra cima. Não dá! Morro de vergonha em saber que enquanto meu bumbum fica virado pra cima, pessoas vão passando pertinho de mim.
Desanimo só de ver aquele formigueiro de gente prá lá e pra cá na praia, famílias inteiras comemorando não sei o que com latinhas de cerveja na mão e aqueles vendedores de sanduíche natural desesperados insistindo pra você comprar aquela fatia de pão de forma com alface picada, e aquela mistura de cenoura com maionese vencida.
E as crianças? Gritando alucinadas "pai, mãe, achei uma concha!" "Vem veeeeeer!"
Por falar em crianças, já levei bolada na praia. Aquelas bolas enormes que as crianças brincam, me acertaram por duas vezes que desisti de ficar deitada na areia. Sempre tem um atentado pra me tirar a paz e depois, pede desculpas com a maior cara de pau do mundo deixando bem claro que você é tia sim. "Desculpa, tia"
As filas intermináveis para ir a um mercado ou padaria desanima qualquer um. Quando chega a minha vez de ser atendida, parece que ganhei um prêmio e, termino disfarçando a minha emoção com o saco de pão em mãos. Fico agradecendo a atendente o tempo inteiro: "obrigada, obrigada, obrigada". A noite, pra dormir, quem disse que os mosquitos deixam. Terminam de transformar o passeio a praia em um caos. Tomar banho é a mesma coisa que nada! A gente já sai suada do chuveiro e me faz lembrar a época que eu saía de casa toda perfumada de Giovana Baby para pegar o transporte público. Eu trabalhava em uma loja de roupas e sentia meu rosto escorrer na ida e na volta. A maquiagem derretendo por completa e, a franja grudada na testa. Sem contar que eu ainda tinha de chegar na loja sempre com o sorriso de orelha a orelha.
Definitivamente, verão nunca foi e nunca será o meu forte. Quando vocês virem minhas fotos ao lado de coqueiros e céu laranja, tenham certeza que será montagem, porque pra mim é impossível sorrir em calor de 40 graus. Nada flui.
Mas, enquanto "as águas de março não fecharem o verão" vou ficar torcendo para dias mais frescos. Quem sabe eu ainda consiga pegar uma praia do jeito que idealizo?
Pronto! Já reclamei demais! Agora é buscar ser grata e, pedir perdão a Deus por todas as coisas que fico lamentando. Vou continuar buscando algum charme no verão mas, sei que não será fácil. Não gosto, não curto e, tô nem aí pra ele.