MINHA MELHOR CRÔNICA
Outro dia recebi uma notícia triste: Um dos meninos da rua Guarani já não estava mais entre nós! Era o menor de todos. Era o caçula Era o nosso goleiro nas peladas de rua. Rabisquei despretensiosamente algumas linhas e enviei ao seu irmão como lenitivo. O texto em si era um recorte de uma atuação do “neném” em um lance imprevisível daqueles que só acontecem nas peladas de rua. Quando a noite chegou comecei a receber ligações de Curitiba. Olhei o celular e tinha mensagem de um número desconhecido, um tal Dr. Sebastião: “Oi, eu li o seu artigo, posso te ligar? Respondi desconfiado que sim, imaginando se não seria mais uma daquelas querelas políticas que volta e meia eu me enfio.
- Alô!
Aqui é o Sebastião, o irmão do Edson, lembra?
- Edson? Qual Edson?
- O Edson Roque!
- Ah!, o Guitinho?
- Sim! Aqui quem fala é o Sebastião, irmão dele, lembra?
- Então você é o Dinda?
- (Risos) Faz mais de 30 anos que ninguém me chama por esse cognome!
Se estivéssemos próximos nos abraçaríamos três vezes como fazem os amigos que não se veem há muito tempo.
- Caramba! Sabe que a última vez que te vi foi no Bar Maracanã em Astorga - Pr. Você estava comendo um lanche, e com uma mochila de viagem, lembra?
- Não me lembro! Faz muito tempo!
- Pois é! Você influenciou a minha vida de um jeito que você nem pode imaginar.
Sério? O que eu fiz?
- Perguntei se estava de viagem e você respondeu:
Estou a caminho de Brasília!
- Brasília? O que vai fazer em Brasília?
- Pretendo me alistar na P.E e servir o exército Brasileiro.
- É sério isso?
- Sim! Esse é o meu projeto.
- Não temos ônibus com conexão para Brasília, disse eu.
- E quem disse que eu vou de ônibus? Eu vou de carona. Mas, de que maneira eu influenciei a sua vida?
Olha a foto do perfil. Acabei virando um caronista profissional na juventude. Mas, e aí? Chegou em Brasília?
- Sim! Cheguei em Brasília de carona, me alistei no Exército, servi na P.E. Segui carreira militar, graduei-me em Direito, depois pedi baixa e prestei um concurso público para Delegado da Policia Civil em Curitiba. E lá se foramn os anos. Acabei de me aposentar.
- Puxa vida! Que história! O seu Q.I deve ser altíssimo.
- Que nada! Quando a gente leva porrada da vida o tempo todo a gente aprende a sair batendo também.
- Pois é! Quando eu li a sua crônica algo adormecido dentro de mim despertou e eu viajei nas suas linhas. Eu me emocionei. Eu estava naquele jogo. De repente, tudo voltou à vida em minha mente. E eu revivi cada lance daquela partida em câmera lenta.
E conversamos, sobre tudo, a família, a vida, amigos, futebol. Relembramos incidentes pitorescos e histórias engraçadas. Por fim, na hora de desligar ainda batemos mais meia hora de papo como fazem os amigos que há muito tempo não se veem.
Então, a minha melhor crônica não foi aquela que escrevi em busca de engajamento. Não foi aquela que gastei o vernáculo. Não foi aquela esperava o melhor retorno. A minha melhor crônica foi aquela que cumpriu o seu papel social: remexer com os sentimentos das pessoas e fazer que as emoções transbordassem.
Mas, o que foi afinal que escrevi de forma tão despretensiosa?
“... Vai... vai! Recua para o Dinda, isso! vai... vai... toca no Barrela! Caramba! Larga de ser fominha Linguiça!! Toca essa bola! O Guitinho tava livrinho. Tá pensando que é o Zico?...” E a batalha seguia repleta de lances imponderados e inimagináveis...