DONA DIDI

 

Pelos corredores do colégio primário estavam elas duas: “Bina” e “Dona Didi”... Dona Didi me assustava pra caramba. Tinha olhos miúdos... mas não era cega, muito pelo contrário! Parecia ver tudo e todos. Ela parecia ter a idade DA IDADE. Naquela época era com certeza a pessoa mais velha que eu já tinha visto pessoalmente. Eu tinha uns 7 anos. Ela gritava, berrava em nossos pequenos ouvidinhos avisando que o recreio tinha acabado. Sabíamos disso, pois havia uma sirene (muito alta) que tocava na hora. Dava pra escutar a sirene do lado de fora da escola... Já a Dona Didi, talvez até os japoneses pudessem escutar!

Já a Bina, bem... eu NEM SEI o que Bina fazia de tããããão BENEVOLENTE assim... que todas as crianças eram loucas por ela. Ela sorria mais do que a Dona Didi. Na verdade sorria bastante. Estava sempre sorridente. Quando um de nós vomitava ela era acionada e surgia rapidamente com uma vassoura uma lixeira e outros apetrechos. Nesses momentos específicos ela ficava extremamente séria e concentrada. Bina tinha um macete de jogar areia em cima do vômito pra facilitar e agilizar o processo da limpeza e eu achava isso fantástico. Via como um superpoder... Adulto uma vez, de ressaca, tentei limpar um vômito assim. Não deu certo.

Então, a gente tinha que escolher o funcionário mais querido do ano e obviamente, Bina era SEMPRE a escolhida, enquanto o resto ficava... talvez... sei lá; com cara de cu talvez? Eu não me importava... Eu era apático e detestava a escola. As crianças corriam para abraçar Bina e eu não ia. Eu gostava de conversar com os porteiros enquanto aguardava meu padrinho que me buscava na escola. Às vezes ele se atrasava e batíamos "papos-cabeça" (papo-cabeça ao menos pra mim)... E ser 'Do Contra' era quase um esporte. Portanto... Era fora de cogitação... Gostar de Bina. Por que todos gostavam. Eu já tinha o rock precocemente alojado no sangue, através dos Guns’n’Roses e coisas que tocavam na Transamérica. Era um baita d’um revoltadinho. Certa feita, uma professora – daquelas bem tiranas/era o que tínhamos... - determinou que escolheríamos a Dona Didi e toda aquela sua histeria senil para ser a nossa predileta do ano. A turma protestou, queriam a Bina para o tetracampeonato... Mas não adiantou.

Me lembro de Dona Didi entrando na sala e todos nós batendo palmas e fazendo a maior festança. Dona Didi estava emocionada, um pouco assustada... Ela quase não falou... Muito menos gritou. Naquela hora Dona Didi não tinha a tarefa infeliz de ter que avisar a todos... que a brincadeira acabou.

 

Henrique Britto
Enviado por Henrique Britto em 08/12/2023
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