No caminho com Eduardo Alves da Costa
O poema “No caminho com Maiakóvski” de Eduardo Alves da Costa, duas estrofes são particularmente significativas:
“Tu sabes,
conheces melhor do que eu
a velha história.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.”.
Esta fala da nossa falta de reação, por comodismo ou covardia, ao que nos ameaça. Muitas vezes percebemos o Mal que se aproxima e nos limitamos a “deixar tudo por conta de Deus”.
Aí, depois que o Mal se instala, nos tornamos instrumentos dele e somos obrigados a servir aos seres das trevas que só aumentam em número.
É o retrato atual do Brasil.
“Vamos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,
no plantio.
Mas ao tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso
defender nossos lares
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre nós que marcham os soldados.”.
Aqui ele diz dos que nos usurparam o Poder e nos fazem de escravos e também nos usam para que lhes provamos sustento e luxo. Dizem que não precisamos e não podemos ter armas porque o Estado nos protegerá, mas na realidade nos querem fracos e desprotegidos.
Alimentam nosso medo natural até que nos tornemos uma legião de covardes e nos comportemos como certos cães que se assustam com uma simples batida de pé.
Este poema foi escrito na década de 1960 como protesto contra a ditadura militar, mas observemos que naquele período não usávamos deixar nossas casas trancadas 24 horas por dia, caminhávamos nas ruas a qualquer hora do dia e da noite e comprávamos armas de fogo, que ficavam expostas em vitrines de lojas, com uma simples autorização da Polícia Civil.
Aliás, a possibilidade dessas armas serem usadas para nossa proteção era remota, porque nossas vidas e propriedades raramente eram ameaçadas. Elas serviam para atirar em garrafas.
O que diria o autor, que protestou contra uma ditadura e profetizou sem querer uma “democracia” muito mais espoliadora em todos os sentidos?
Triste povo que não encontra seu caminho.