a era da ignorância - BVIW
Já é fato que a preguiça com o aprendizado tradicional, que envolvia pesquisa e autonomia de pensamento, está dominando o universo escolar desencadeada pelas ferramentas digitais. Para além disso, há a preguiça dos que preferem ver o filme a ler o livro (ou ler o resumo na internet), fruto da obtusidade intelectual de que um livro se resume ao enredo, e uma vez que se sabe o desenrolar da história, nada mais precisa ser sabido, nenhuma relação com a própria vida, estabelecida. Quando um fato novo ou um conflito eclode no mundo, basta meia dúzia de vídeos no YouTube, duvidosos e enviesados, para formar doutores no assunto, prontos para defender seu lado com unhas e dentes, tomando o partido seja de palestinos ou ucranianos, russos ou judeus. Também essa fonte de "informação" foi amplamente utilizada durante a pandemia da covid para desacreditar as vacinas e, do mesmo modo, para disseminar a não tão recente teoria da terra plana, que possui adeptos fervorosos. No livro "O culto do amador", de 2007, o autor Andrew Keen já prefigurava essa avalanche de "achismos" sem nenhuma base no estudo profundo e a longo prazo, ganhando voz e ameaçando várias instâncias do conhecimento. E no "O Globo" do último sábado, num texto ao mesmo tempo melancólico e assustador, o escritor português José Eduardo Agualusa fala do adoecimento e morte da realidade, num mundo onde as pessoas são incapazes de distinguir entre uma sátira e uma opinião verdadeira. O século XXI nos tornou riquíssimos em fontes de informação, mas está depauperando sobremaneira a nossa capacidade de reflexão.