Orgulho
Na minha mania de racionalizar o que não é para ser racionalizado, iniciei a conceptualização de um sentimento que nutrimos internamente e que se torna, para muitos, o grande veneno da alma humana, responsável por perdas incalculáveis: o orgulho.
No contrassenso dessa máxima, creio que o orgulho não seja um sentimento ruim e se bem dosado, pode proteger a própria alma humana.
O orgulho nos faz interpretar ações e palavras de forma a nos proteger, faz com que tenhamos senso de ridículo para frear ações que por vezes nos frustram - antes mesmo de acontecerem - traz o aprendizado de andarmos por conta própria - sem a dependência humilhante de terceiros - impõe a necessidade de crer em nós mesmos, na nossa capacidade de sermos autossuficientes.
Mas como toda toxina, se mal dosado, tornará o maior dos tormentos humanos. Nietzsche, em seu livro "Assim Falou Zaratustra" nos demonstra como o orgulho mal dosado pode ser danoso transformando-nos em nossos piores inimigos:
"O pior inimigo, todavia, que poderás encontrar és tu mesmo. Nas cavernas e nos bosques és tu que te espreitas a ti mesmo. Solitário tu segues o caminho que te conduz a ti mesmo. ”
No entanto, Nietzsche na sequência do trecho acima explica que o autoconhecimento, o mergulho no escuro e profundo do inconsciente, na busca pelo reencontro com seu próprio eu, será o maior e mais doloroso desafio humano, um esforço hercúleo, mas necessário:
“E por teu caminho desfilam diante de ti, tu mesmo e teus sete demônios. Serás herege para ti mesmo, serás feiticeiro e adivinho, doido, incrédulo, ímpio e malvado. É preciso que sintas a necessidade de consumir-te em tua própria chama. Como queres renascer sem primeiro te conduzires às cinzas?"
Após esse mergulho, após a descoberta do seu pior eu, será possível o renascer de um novo ser, como a grande fênix. Mas encarar o seu pior eu, além de não ser fácil, é muito doloroso.
Esse sentimento, assim como alguns outros, são neutros e terão as exatas proporções de seu uso pelo ser humano, em si ou em outros, com uma diferença, esse sentimento carrega consigo outros que se não conhecidos e dominados, corrompem, destroem e mutilam o coração e a alma humana.
O orgulho traz a sensação de controle, domínio sobre tudo e todos, no entanto, nada pode ser efetivamente controlado e vez ou outra nos veremos envoltos por situações que nos derrocam, nesse momento veremos a necessidade do outro, percebemos que não somos tão autossuficientes assim e com isso nos sentimos humilhados, deprimidos, sem razão de viver.
Descobrir-se orgulhoso, no sentido pejorativo da palavra, traz o conhecimento de que se é arrogante, prepotente, desprezível.
Não percebemos que a humilhação que sentimos é puramente fruto de nosso inconsciente, nós criamos os padrões que seguimos e isso começa desde o nascimento.
A necessidade de ajuda, seja financeira ou emocional, só é vista como humilhação quando o orgulho se sobrepõe à gratidão.
Temos que ter orgulho, não conseguimos viver sem ele, mas precisamos ter orgulho de quem somos e nos tornamos, orgulho do caminho trilhado, da família construída e unida, dos amores vividos e preservados.
Em alguns momentos temos a necessidade de nos afastar um pouco das pessoas, de viver mais internamente, fazer sistematicamente esse mergulho em nós mesmos para que nunca nos esqueçamos de que não somos oniscientes, onipresentes, não somos deuses e justamente por isso precisamos ser gratos pelo pouco que a vida nos oferece.
Não digo, com isso, que temos que nos resignar com o mínimo, aqui o orgulho bem dosado, unido a objetivos definidos e determinação, nos impulsionará a crescer como pessoa.
A vida é mutável e não nascemos plantados no chão, precisamos estar em constante movimento e todos esses sentimentos serão responsáveis por nossas constantes mudanças.
Orgulho, sentimento ambíguo que, se não for bem ministrado, se torna um animal feroz capaz de devorar o que ou quem se aproximar, mas caso contrário, se acompanhado da verdadeira gratidão por tudo que já se conquistou e ainda conquistará, nos faz sair da inércia em busca do que nosso coração deseja.
Não estamos sozinhos, não precisamos estar, não conseguiremos estar, por esse motivo temos sim que ter orgulho, orgulho de quem somos e de quem nos acompanha nessa caminhada que é a vida, que por mais difícil que seja é a única que temos.
A humildade e a gratidão aliadas ao orgulho bem ministrado é tudo que precisamos para vivê-la.