APARÊNCIAS ENGANAM

O ano era 1992, viajara para São Paulo para um curso de uma semana. Pegara o primeiro voo do Santos Dumont para Congonhas. Um ônibus me deixara no Centro, de lá percorreria a pé o trecho restante para meu hotel, ali do ladinho da Praça da República.

Já se desfrutava um sol de quase dezembro, o que deixava as ruas paulistanas com um ar pesado, pois além das partículas normais em suspensão por conta do volume de trânsito, ainda recebia uma carga extra proveniente das obras do metrô.

Por incrível que pareça, caminhava tranquilo naquela selva de pedra, agora entre precários tapumes que delimitavam o espaço reservado aos pedestres, quando senti minha pochete se soltar da cintura. O pivete aparentava ter no máximo uns quinze anos, partiu correndo na frente com o produto do furto na mão.

O movimento de transeuntes era intenso, devido ao pouco espaço de circulação, com o agravante da irregularidade tanto do piso, como das madeiras que delimitavam o caminho a ser seguido.

O adolescente gatuno deve ter ficado muito à vontade ao escolher e atacar uma vítima com a cabeça já bem esbranquiçada e que ainda carregava uma mochila às costas. Deve ter pensado, será mais fácil que tirar o picolé de uma criança, provavelmente este senhor nem vai se dar ao luxo de tentar me perseguir.

Ledo engano do larápio, que na sua fuga olhava constantemente para trás, e via que suas suposições não se confirmavam. Se a princípio, a distância entre os agora corredores guardava uma certa segurança, no entanto, esta se tornou perigosamente próxima.

Tempo passando e a corrida se mantinha sem um favorito, ambos conseguiam sentir e ouvir a respiração descoordenada devido ao esforço que precisava ser despendido.

A desvantagem de carregar um lastro (mochila) já deixara minhas roupas também pesadas de tanto suor, achei que este seria o momento do ataque final, para recuperar meus pertences.

Acelerei a passada, eu já podia tocá-lo, optei por atingir suas pernas magricelas, com ele caído, eu levaria vantagem no confronto agora inadiável.

A cena seguinte vista em câmara lenta, foi seu tombo projetado para frente, função da velocidade e minha bolsa voando para a direita, solta no ar. Ainda tive tempo, agora com adrenalina percorrendo todo o corpo, de agredir com chutes o agora acuado ladrão, antes mesmo de recuperar minha bolsa e retomar o caminho para o hotel.

Depois, fiquei pensando cá com meus botões, tanto idoso para ele dar o seu bote e resolveu justamente escolher um, que não por acaso, usava tênis de corrida, calça jeans e camisa esportiva.

Teria sido ele pouco cauteloso na leitura da vítima?

Alcides José de Carvalho Carneiro
Enviado por Alcides José de Carvalho Carneiro em 27/11/2023
Código do texto: T7941846
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2023. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.