O sósia que morreu no lugar de Hitler

Antes de começar a contar a história anunciada no título, peço licença a vocês para narrar um episódio da minha vida, ele é breve, e servirá como prólogo à crônica de hoje.

 

Nasci e vivi até aos meus 14 anos em uma pequena cidade de Santa Catarina, colonizada por alemães. Lá, tive a oportunidade de conversar com muitas pessoas que viveram na Alemanha durante o regime nazista; algumas leais ao Terceiro Reich; outras tantas, vítimas dele.

 

Quando íamos para a escola, precisávamos caminhar aproximadamente uns três quilômetros. Se a sorte nos sorrisse, pegávamos carona em uma carroça. Mais ou menos na metade desse trajeto, havia uma casa simples, porém envolta em mistérios.

 

O morador solitário daquela choupana passava os dias a ler na varanda. Simples e sorridente, parecia ser inofensivo. Contudo, éramos proibidos de falar com ele. Às vezes, eu escutava os adultos conversando sobre o nosso vizinho, sempre se referindo a ele como o “Doutor”.

 

Homem feito, comecei a me interessar por história e descobri a lenda que envolvia aquele ancião: O “Doutor” seria ninguém mais, ninguém menos, do que Joseph Mengele, o médico nazista que ficou conhecido como o “anjo da morte”.

 

Relatos semelhantes existem aos milhares, e até mesmo historiadores sérios tem dúvidas sobre o paradeiro real de alguns nazistas proeminentes. Nessa crônica, falarei sobre uma dessas teorias: a história de Ferdinand Beisel, que supostamente morreu no lugar de Hitler.

 

Ferdinand Beisel era um homem comum, um alemão que igual a outros milhões, via com absoluta naturalidade a sua participação no nazismo. Certa tarde, Beisel repetiu o costumeiro ritual de se dirigir a uma cervejaria para beber e brincar com os amigos. Não sabia ele, que em poucas horas a sua vida tomaria rumos totalmente inesperados.

 

Depois de alguns copos de cerveja, Beisel começou a imitar Hitler. O fato passaria totalmente despercebido, se não fosse por um detalhe: lá estavam presentes alguns membros do alto escalão nazista. Sem hesitar, eles prenderam o pobre bufão, acusando-o de zombar do Führer.

 

Contudo, as mesmas pessoas que levaram Beisel para a prisão, viram algo positivo na sua assombrosa semelhança com Hitler.

 

Nos últimos dias da Segunda Guerra, a preocupação com a segurança de Hitler era redobrada. Entre outros vários planos, estava o de usar sósias que ficariam no lugar do Führer, em eventos considerados perigosos. Quando foi apresentado a Martin Bormann, o segundo em comando na Alemanha nazista, Ferdinand Beisel ganhou um novo papel no agonizante Terceiro Reich: daquele momento em diante ele seria o sósia oficial de Adolf Hitler.

 

Para alguém que certamente passaria ao largo da história sem deixar marcas profundas, viver junto à alta cúpula nazista tinha lá o seu quinhão de glamour. Entretanto, quando o Exército Vermelho se aproximou de Berlim, essa cortina de ilusão se desvaneceu. A morte galopava sedenta das estepes russas. Beisel ficou agitado e preocupado. Ele pagaria por pecados que não cometera.

 

Com a iminente queda da capital alemã, o interior do bunker de Hitler mergulhou no caos, mas uma certeza flutuava no ar viciado do espaço subterrâneo: o ditador não estava mais lá.

 

O contato visual com o Führer passou a ser evitado; perguntas, antes abundantes, agora já não eram feitas. A saudação ao líder nazista perdera o entusiasmo, e os seus colaboradores mais íntimos nem sequer o cumprimentavam.

 

Restava o último ato da peça orquestrada pelos responsáveis em garantir a fuga e a sobrevivência do verdadeiro Hitler: a sessão de fotos do ditador observando os escombros da Chancelaria do Terceiro Reich. Quem está nas fotografias é Ferdinand Beisel, o desafortunado sósia, que selou o seu destino naquela fatídica tarde em uma cervejaria, ao imitar o líder supremo dos nazistas.

 

Em seguida, vieram o famoso suicídio de Hitler no bunker; o corpo removido para o pátio da Chancelaria, onde foi colocado ao lado do de uma mulher identificada como Eva Braum; a cremação e o surgimento de um cadáver, reconhecido pelos russos como sendo o de Hitler. Tudo teatralidade, quem morreu foi Ferdinand Beisel, um bode expiatório que os Aliados aceitaram de bom grado.

 

O verdadeiro Hitler havia embarcado em um submarino da classe XXI, e navegava rumo ao seu novo lar. O homem que mergulhara a humanidade em um oceano de sangue, seguia viagem, ao lado da amante, para um lugar bem distante e tranquilo… o sul da Argentina.

 

Mas essa; essa já é outra história!