Mister M dos poetas
Lembram-se do Mister M? O cara, oculto atrás de uma máscara, apareceu no “Fantástico” da Rede Globo, fazendo mágicas impressionantes, despertando assombro e admiração. Posteriormente, em 1999, em um quadro do mesmo programa, revelou os segredos de vários truques de mágica, ou, simplesmente, de ilusionismo. Tais revelações despertaram a revolta e a indignação dos outros mágicos e renderam alguns processos judiciais contra a Rede Globo.
Tão antipático e inconveniente como o tal Mister M, venho, pela segunda vez, desmistificar as famosas “paixões” dos poetas e poetisas, que arrancam suspiros e lágrimas dos seus pretensos musos e musas ou, simplesmente, dos seus fervorosos enamorados. A primeira foi quando, na crônica “O amor nos poemas de amor”, sugeri – talvez causando indignação aos românticos de plantão - que os lacrimosos versos dos brilhantes poetas Tomás Antonio Gonzaga, Castro Alves e Gonçalves Dias, feitos em louvor às suas respectivas e famosas musas, Dorotéia de Seixas, Eugênia de Castro e Ana Amélia, provavelmente teriam sido inspirados mais por emoção poética do que por verdadeiro sentimento de perda amorosa.
Quero advertir, entretanto, que não me assiste o direito de generalizar, de modo que vou tratar do assunto com base nas informações que estão disponíveis na minha própria oficina mental e naquelas que capturei junto aos meus mais íntimos amigos e amigas, também poetas e poetisas. Espero, desse modo, ficar a salvo de processos judiciais por parte de poetas e poetisas que proclamam reais ou eternos os seus amores cantados em versos.
Quanto a mim, logo declaro que muitas vezes fico em dúvida a respeito da fonte da minha inspiração poética: imaginação ou loucura?
Como bom e legítimo cabra macho nordestino, uma mulher "bonita e gostosa da molesta" faz o sangue correr atropelado pela minha veia poética. E aí, desde muito embaixo do umbigo até o último e esquecido neurônio, a inspiração percorre ardente caminho, enquanto os meus versos gemem e suspiram pela bela. É real esta paixão? Claro que é! Até a próxima mulher "bonita e gostosa da molesta"...
Depois, hei de convir comigo mesmo que sou um doido manso, conforme já diagnosticou o meu psicanalista. Movido por carências afetivas ancestrais, ilusões, sonhos e fantasias, estou sempre localizando e identificando, preferencialmente em amigas bonitas e inteligentes, a tão esperada musa ou, para usar um lugar-comum, a minha alma gêmea. E lá explode pelos ares o dilacerante grito de uma alma apaixonada! É real esta paixão? Claro que é! Até que descubro que a minha pretensa musa tem a audácia de gostar de outro ou que pensa em mim da mesma maneira e intensidade como pensa a Gisele Bündchen. Nadinha...
Da loucura à imaginação destrambelhada (que alguns chamam de fértil) é um pulo só. À lembrança de paixões antigas ( dores-de-cotovelo antigas), ao dolente som de tangos e boleros encantados e encantadores ou sob o efeito de um depressivo entardecer ou de uma insone madrugada, meu coração pode soluçar (literalmente!) e arrebentar-se em versos para musas presentes, passadas e futuras! É real esta paixão que não sei por quem? Claro que é! E ainda maior e eterna, como afirma um poeta: “Amor maior é o que se espera, pois eterno é o que se espera e nunca nos chega.” Mas o amor "que nunca me chega" , embora de mágico encanto e fonte de emocionantes versos, demora muito e eu, frágil ser humano, começo a perceber que perto de mim há amores que podem chegar muito mais rápido, portanto, de exigência poética menos platônica.
Não estou só nisso. Vejamos outros exemplos:
A minha amiga Z., bela e inspirada poetisa do Recanto das Letras, posta poemas lindos e apaixonantes, sonetos deslumbrantes de amor, desejo e paixão. Perguntei-lhe quem era o felizardo que conseguira despertar em sua alma tamanho e ardente sentimento. Respondeu: “Não há musos. O meu amor é todo idealizado. Canto, pois, o amor que espero que venha.”
Da outra amiga D., também bela e inspirada poetisa do Recanto, o susto e o engano foram maiores. Estávamos em clima de flerte virtual, em que ela exibia um certo ceticismo sobre o meu interesse, não só porque, na sua opinião, poetas não são confiáveis, como também desconfiava de que eu não estava curado da minha mais recente crise de “desmusamento”.
Pois bem. Então a poetisa postou um lindo, mas estranho poema, em que falava de “os seus sentimentos terem sido tripudiados, de estar colocando o seu pescocinho numa guilhotina, de sangue vermelho e borbulhante escorrendo, etc”. Fiquei apavorado! A poetisa ia matar-se e eu seria o responsável pelo ato extremo da tresloucada apaixonada!
MSN e Gmail acionados, entrei em contato com a poetisa e pedi explicações sobre as intenções do poema. Surpresa, respondeu que não havia intenção nenhuma, e que eu não procurasse interpretar o poema, pois não havia nenhuma interpretação possível; tratava-se de um sonho recorrente, provavelmente uma imagem flutuante em seu subconsciente. Além do mais, ela aduziu, quando fez o poema, estava “naqueles dias”.
Pelos chifres de Satanás! Era um “poema-absorvente” e eu, todo aflito, pensando que a mulher queria decapitar-se por mim!...