Já escrevi antes sobre flores e sobre pássaros. É uma coisa muito minha. É possível ver as cores, o caminho e o vazio. Você vê? Está em cada palavra que escolho. Escrever é sobre escolha, você sabe disso. Posso dizer qualquer coisa sobre qualquer coisa, mas escolho estas aqui. Percebe? E você, se me conhece pelo meu texto, sabe, assim como eu, que no fim vai se surpreender ou se encantar com alguma coisa que eu, nesse ponto do texto, também ainda não sei o que é. Quando começo, não sei ainda o que quero da escrita, apenas permito que flua. Quando travo, volto na primeira frase. É assim, geralmente eu me apaixono pela frase e então ela me guia. É um sentimento, um peregrino, uma estranheza. E você também é tomado por isso, por essa razão ainda está aqui, esperando para conhecer o que é. Escrever tem uma coisa assim, que faz a gente descobrir o que (quem) é. Partes de nós vão se apresentando quando uma palavra golpeia do jeito certo. 

    Então a frase é uma pergunta dessa vez. De ninguém menos que Pablo Neruda: “como se chama uma flor que voa de pássaro em pássaro?” e eu quis fazer poesia. E então a mente completou antes que eu pensasse melhor: “chama-se eu”. A flor que voa sou eu. Voo de pássaro em pássaro. Não sei se vou saber ir além, chegar na parte da surpresa e do encantamento, espera um pouco, me dá um segundo. 

    Tá, é assim. Em 2017 eu escrevi: “Ser flor não diz a que lugar pertenço. Posso ficar presa ao caule, posso me soltar, posso ir com o vento, posso florir, posso não desabrochar com o sol. Posso passar a vida querendo ter nascido em outra árvore. Posso querer ser árvore.” [...] Querer ser flor é de mim, é antigo. Voar é de agora. É que antes eu sabia da liberdade sim, mas não que era coisa para durar. Era matéria de sonho, de poesia. E então cresci e livre era algo para ser.  

      (E aí está, outra frase para me apaixonar).

    Escrever sobre flores e pássaros. De um jeito ou de outro talvez esteja aqui um pouco da minha obsessão criativa. Cor, caminho e vazio é liberdade, mas eu não precisava te contar. Enquanto você lê, sabe que está se libertando, tem qualquer coisa se desacostumando a existir igual. Como uma flor que aprende a voar. Vira pássaro.