DE LISBOA A CALCUTÁ, passando por Paris e Nova Iorque.
A cidade do Rio de Janeiro, quando subitamente recebeu a fugidia família real, era para lá de pacata, precisou expulsar muita gente de casa, para enfim abrigar a entourage de nobres, que veio para o sul do Equador, por conta dos sonhos de grandeza do então imperador francês.
Logo, a acanhada capital do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves foi se transformando numa pequena Lisboa, com menos colinas que as sete tradicionais, que tão bem caracterizam o relevo lisboeta.
Com o início do período republicano, a capital precisava eliminar seu aspecto colonial, a inspiração persistia ainda européia, mas agora com o glamour parisiense. Até inventamos um Haussmann tropical, inspirado em seu modelo de inspiração urbana, botando abaixo boa parte de centro histórico, e assim traçar longas, amplas e arborizadas vias e calçadas.
Em qualquer foto da época, fica explícita uma cidade com ares cosmopolita, que poderia muito bem estar em qualquer país do Velho Mundo.
Com o fim da Segunda Grande Guerra, o modelo prevalente passa a ser o ianque, com seus arranha céus, e a Avenida Central, não se fez de rogada, e logo viu brotar no mesmo chão a terceira geração de imóveis, desta vez sem o requinte de estilo da geração anterior.
Agora, aço e vidro passam a ser o acabamento da moda. Em pouco tempo, a via mais badalada da cidade, repete um fenômeno nova-iorquino, criando num cânion artificial, onde o sol consegue iluminar o solo por uma escassa hora, mesmo no auge do verão.
O esvaziamento política da antiga capital federal, relegada momentaneamente ao status de cidade estado, preservou muito de suas habituais características. Com o novo rebaixamento, agora definida como capital de um estado conservador e economicamente inviável, levou-a a perder de vez sua capacidade de resiliência.
O Centro da cidade do Rio de Janeiro foi literalmente tomado por uma espécie de negócio informal, o ambulante que se fixou ao território, e gradativamente vai degradando seu entorno, inclusive mostrando associação direta com outra ocupação informal das franjas dos bairros, a favela, ou pior ainda, um conjunto delas, conhecido como complexos.
Em lembrar que o rico patrimônio do centro histórico corre sério perigo de se deteriorar, pois se num primeiro momento teve seu esvaziamento como resultante da longa pandemia, que mostrou as vantagens do trabalho remoto e gerou um excesso na oferta de imóveis comerciais sem uso na região.
Enquanto boa parte do comércio formal cerrou portas com a pandemia, o comércio informal expandiu suas fronteiras, e a Rua Uruguaiana de hoje se configura como o melhor exemplo de degradação da área central, com portas do comércio formal fechadas e o camelódromo se expandindo por sua calha, onde gigantescas lonas azuis cobrem praticamente todo o logradouro, protegendo das intempéries um numeroso contingente de migrantes latino americanos, que comercializam produtos de origem duvidosa a preços populares.
Essa degradação se instalou exatamente na área melhor dotada de infraestrutura urbana, mostrando por enquanto cenas típicas de uma nova Calcutá em solo sul americano.
E o mais triste, não existe nem o túnel para se ter ainda esperança de luz.