A terra de Dôra
Sonhava em conhecer o norte de Minas Gerais, Vale do Jequitinhonha, região de origem dos pais de meu esposo. Em julho de 2017, programamos a viagem para Salinas junto com minha irmã e cunhado. Foram mais de doze horas cortando as estradas mineiras, conhecendo várias cidades, e fotografando as paisagens que iam mudando à medida que nos aproximamos da região de destino.
Fomos acolhidos pelos familiares de meu esposo, cuja casa de Clarinha e Zé Russo foi nossa durante uma semana. Boa cama, mesa farta, corações enormes e a disponibilidade de tempo para nos apresentar a cidade, seus encantos e desencantos. Cidade interiorana, acolhedora, beleza típica nordestina, terra das cachaças premiadas internacionalmente e de um Mercado Municipal incomum e com muitas tradições. Como toda a região, Salinas sofre pela estiagem das chuvas por períodos longos.
Essa aridez, sol abrasador e a escassez das águas faz das terras um chão seco, cascalhado, triste, porém não afeta o coração de seus moradores, que mantêm a alegria e o orgulho de ser parte daquele espaço.
Nas andanças da semana, fomos apresentados ao bairro rural Baixa Grande, a pequena vila da prima Dôra, Dôra de Nego. Ao vislumbrar à distância o vilarejo, no alto de um pequeno elevado, um batimento apressado me apertou o coração. Senti que encontraria e viveria ali emoções indefinidas.
Numa casinha humilde, Dôra nos recebeu com um abraço demorado, um afago no rosto, um gesto de alguém que esperava ansiosa por uma visita especial. Nego abriu o sorriso mais espontâneo, acompanhando o acolhimento da mulher.
Em cima do fogão havia uma fartura preparada desde as primeiras horas da manhã. Muito pão de queijo, bolos, café, pão e broa caseiros. Saborosos também foram os pratos preparados para o almoço. Uma quantidade que poderia abastecer mais de uma dezena de pessoas. Servidos com esmera higiene, cobertos com panos de prato alvíssimos. Toda a cozinha com a mesma limpeza, alumínios brilhando nos aparadores. E o sorriso de Dôra insistindo para fazermos a nossa refeição.
No centro do vilarejo, a igreja do Bom Jesus abençoa as casinhas que a circundam. No alto do prédio santo o sino espera por mãos que fazem os seus badalos ecoarem além daquelas moradas. Em devoção ao santo, anualmente uma festa reúne algumas centenas de pessoas oriundas de todo o município. Festa conhecida pela alegria do povo e a abastança de alimentos, festa esperada pelo baile que vai noite adentro. Festa para arrumar namorados.
Ao sair para conhecer os moradores, senti que éramos esperados por todos. Visitas e parentes de Dôra são também família de todos os demais vizinhos. Em cada casa, o mesmo abraço apertado, a autenticidade do carinho inicial, o oferecimento da água fresca, do café, da prosa afetiva, das histórias da família e o convite para participar da festa do Bom Jesus. Assim os abraços e os parentes se multiplicaram. Terra de Dôra também é terra de Zefinha, Geralda, Eva, Cotinha, Meza, Nenzinha, Milta, Nica, Zelita e outras Marias do lugar.
Ao final da tarde, foi difícil despedir de Baixa Grande. Na mala, trouxemos o aroma dos alimentos, o perfume das flores dos canteiros, a cor da terra batida e o aconchego de gente da gente. Deixamos um pedacinho de nosso coração plantado ao lado daquele sino da igrejinha e a promessa de uma volta breve.