Aposentada. E agora?
Foram alguns anos de indecisão. Parar de trabalhar fora de casa, deixar uma rotina de 47 anos me parecia sempre muito assustador, por estar acostumada a acordar antes das seis horas e às sete estar no trabalho, inteira, pronta para o dia intenso numa escola.
Horário para acordar, horário para o almoço, o retorno para casa, afazeres domésticos, tarefas escolares, a hora de ir para a cama. Uma rotina sedimentada no corpo e mente de uma professora. Uma vida de realização profissional, de doação na formação de crianças e adolescentes.
Para a família, sobravam horários dos finais de semana, programação de férias, cansaço acumulado. Para mim quase nada, poucos momentos para cuidar da saúde, do lazer e do encontro com os amigos, Via como perda de tempo sentar num sofá para assistir uma televisão ou esquecer do tempo vendo um filme.
O corpo gritou, as dores apareceram, o marido reclamou, os filhos pediram. É hora de parar, buscar mais qualidade de vida, usufruir do que adquiriu ao longo da vida. O dinheiro é suficiente, o tempo não espera, os netos crescem. É preciso saber o momento de sair de cena.
Decisão tomada fui me preparando para enfrentar a ociosidade: curso de patchawork, jardinagem, fotografia, viagens, leituras, dormir mais, curtir a família, visitar os velhos amigos. Sem esquecer que com menor quantidade de dinheiro em caixa, é preciso cuidar da vida financeira, ter controle dos gastos. Quero viver para aproveitar as coisas simples, aquelas que trazem felicidade.
Dois meses depois, embora me restabelecendo de uma fratura no tornozelo, começo a gostar da brincadeira. Acordo e levanto muito depois dos galos cantarem na madrugada, faço as minhas orações e me demoro um pouco mais na cama, sento e tomo meu café sem pressa ouvindo música. O que vou fazer depois? Não preciso de uma agenda e nem de uma programação. Quero viver para aproveitar as coisas simples, aquelas que trazem felicidade.
Respondo mensagens, publico outras. Cuido da minha casa, me sento ao sol e brinco na pequena piscina, visito as minhas plantas e cuido do paisagismo. Cuido das minhas dores também. Pesquiso roteiros turísticos, para as viagens que pretendemos fazer em família, ou somente eu e o esposo. Acompanho com o marido jogos de futebol, ou simplesmente assistimos algum filme. Sento em frente ao notebook e registro as minhas memórias.
Escrevo, escrevo o que me dá vontade, do meu jeito, sem preocupação com as normas linguísticas e literárias. Simplesmente vou colocando, brincando com as palavras.
Infelizmente, estamos limitados pela quarentena por conta da pandemia, mas assim que estivermos seguros quero ganhar a estrada e conhecer lugares novos, viajar com o esposo e alguns amigos especiais. Quero revisitar cada pedacinho de Porangaba.
Quero ir sem pressa para a casa dos filhos, visitar os irmãos, passar um tempo com a minha mãe, sem ter que voltar no domingo à tarde. Quero receber os familiares, os amigos, os filhos e brincar com os netos. Preparar boas comidas mineiras e rir sem medo de ser feliz. Quero amar o mesmo companheiro por mais vinte e cinco anos.
A única coisa que peço a Deus é saúde para aproveitar o presente com qualidade. Prometo que vou fazer a minha parte. O resto, só tenho que agradecer, pois tudo já foi me dado com suficiência.