FALAR CONSIGO
Um dos fatos mais notáveis da nossa Espécie é a variação sonora e o extenso vocabulário com o qual expressamos as nossas ideias.
Claro que os outros animais também falam e em muitos casos nós conseguimos entender o que eles estão querendo comunicar, mas para isso é necessária redobrada atenção ou muito tempo de convivência com essas criaturas que, por conta de predadores se comunicam bem mais por gestos e expressões corporais do que por som como nós fazemos na maioria das vezes.
O som que produzimos é na realidade uma melodia que expressa através da variação sonora a maior parte do que estamos querendo comunicar e ainda que o interlocutor esteja falando em “javanês arcaico”, nós seremos capazes de entender a sua necessidade.
Os balbucios nos nossos primeiros meses de vida são a base de todo e qualquer idioma. Além, claro, das expressões corporais e alterações na face pois, afinal, o corpo fala conforme já demonstrado em livro.
Falamos com os animais, com as pessoas, com o amigo invisível de infância, com parentes e amigos falecidos, com os santos de devoção ou com o criador de todos eles, mas principalmente com nós mesmos quando “pensamos alto” efetuando operações numéricas, criando ou revisando o texto escrito.
Nesses últimos tempos de isolamento social, quando todos nós cumprimos a “prisão domiciliar” que a violência da criminalidade oficial, profissional ou amadora nos condena, tenho observado o número crescente de pessoas falando só pelas ruas, nos mercados, nos ônibus, em restaurantes...
E não se trata de comunicação por telefone pois, nem o aparelho nem os fones de ouvidos, por mais discretos que sejam, estão visíveis e na maior parte das vezes, há apenas o movimento dos lábios, semelhantes àquelas pessoas que aprenderam a ler em voz alta e não perderam o costume de movimentar a boca mesmo sem emitir som.
Nossas famílias, a maioria de número reduzido, não se visitam mais e a comunicação, quando existe, é com um emogi de alguma coisa através do zatizapi.
Com o passar do tempo, os nossos amigos morreram sem deixar substitutos e o espelho mostra que nos tornamos pessoa diferente de outros tempos, quando em seu reflexo, ensaiávamos caras e bocas que queríamos demonstrar na negociação de venda, ao ser apresentado àquela pessoa que nos interessava ou para dar vida ao personagem a quem emprestaríamos nosso corpo no palco do teatro.
Há os que dizem que falam sozinhos porque gostam de conversar com pessoas inteligentes...
CITAÇÃO
O Corpo Fala, W. Pierre e T. Roland – Ed. Vozes