SAUDADE DAS COISAS QUE NUNCA FORAM

O dicionário Michaelis de Língua Portuguesa define a saudade como sendo lembranças; recordações; nostalgia ou recordações nostálgicas e suaves de coisas distantes ou pessoas distantes. O dicionário filosófico afirma que saudade é pesar; sofrimento causado pela ausência de algo ou de alguém que nos é querido. A saudade é tema recorrente nas canções e nas poesias. Portanto, que atire a primeira pedra aquele que jamais sentiu saudade.

Sobre a saudade, Tomás de Aquino fez a seguinte afirmação: a dor é por si contrária ao prazer, mas pode acontecer que um efeito colateral da dor seja deleitável, como quando produz a recordação daquilo que se ama e faz perceber o amor daquilo por cuja ausência nos doemos. E assim, sendo o amor algo deleitável, a dor e tudo quanto provém desse amor também o serão.

O cantor e compositor brasileiro Chico Buarque de Holanda também fala sobre a saudade em uma de suas composições. Segundo ele, saudade é o revés de um parto; a saudade é arrumar o quarto, do filho que já morreu.

Eu não tenho uma definição pronta sobre saudade, porque não tenho definir um sentimento. Porém, posso afirma que sinto saudades de um tempo e de coisas, situações e experiências que não vivi. Sinto saudades, por exemplo, das conversas que não tivemos, dos filmes que não assistimos, das músicas que não ouvimos, dos livros que não lemos e das discussões que não tivemos sobre política, religião, problemas sociais, enfim, sobre qualquer coisa.

Sinto saudades dos banhos de açude, de mar e de cachoeira que não tivemos; de como você poderia ter me ensinado a nadar e das gargalhadas que daríamos. Penso que teria sido muito divertido se fossemos acampar, praticar mergulho ou simplesmente caminhar pela praia. Imagino o vento desarrumando os meus cabelos e você carinho e ciumento, tentando arrumá-lo; também imagino nós dois comendo caranguejo na praia, tomando água de coco ou dividindo um sorvete.

Penso com saudade sobre os dias nos quais você jamais esteve a me esperar na saída da escola; das revistas em quadrinhos que não me deu, das flores que não me deu, da atenção que não me deu. Tenho saudade dos bailinhos aos quais não fomos juntos, dos jantares de Natal e das viradas de ano que perdemos.

Jamais tivemos um jantar romântico, e eu sinto saudades desses jantares que não tivemos; dos presentes de aniversário que não trocamos; do dia dos namorados que jamais passamos juntos e diferentemente dos outros casais, não juramos amor eterno. Lembro, porém, que fizemos um pacto de amor sem furar o dedo e eu relembro com muita saudade desse momento.

Sinto saudades dos beijinhos roubados – beijos inocentes – beijos de crianças brincando de gente de grande. Guardo na memória e no meu coração o som da sua voz chamando-me “minha pequenininha”. A pequenininha cresceu e se transformou em uma mulher cheia de saudades de um tempo distante, que ficou lá atrás.

Ao contrário daquilo que as pessoas dizem sobre a saudade, eu não a considero completamente ruim. Afinal, a saudade pode funcionar como um trampolim; um combustível ou bomba que impulsiona o sujeito para frente, a fim de que ele busque alternativas para aprender a conviver com esta saudade. Porque, sendo a saudade um mal sem cura, independentemente do que se faça, ela sempre estará presente; correndo em suas veias enquanto a vida segue.

E assim, eu sinto saudade porque você não dançou comigo a valsa na minha formatura de Jornalismo, nem na formatura em Pedagogia. Você não estava ao meu lado para segurar minha mão em cada uma das ocasiões em que eu senti medo e chorei...

Enfim, como muito bem afirmou o poeta português Fernando Pessoa, não há saudades mais dolorosas do que as das coisas que nunca foram.