Plantas e Música: Uma Pesquisa Que Pode Dar o Que Cantar

Um amigo nosso, chamado Levi, anuncia que resolveu fazer experiências com músicas e plantas, ou seja, fazer as plantas “ouvirem” música para ver no que dá. Não deixa de ser uma iniciativa muito interessante que pode trazer resultados surpreendentes. Mal podemos esperar para conhecer as conclusões iniciais de sua oportuna incursão no campo da pesquisa científica.

Plantas e música—sem dúvida uma combinação inesperada. De imediato, não se consegue ver muita relação; a música é fruto da arte e engenho humanos, enquanto as plantas são o que são: filhas legítimas da natureza.

Modificações, de fato, se têm feito em plantas ao longo dos tempos, desde os enxertos de laranjas em limoeiros até as sofisticadas combinações de genes, alterações de DNA ou sei lá o que mais que se anunciam como avanços promissores da engenharia genética na área agrícola.

Podemos apenas especular sobre o que o futuro dessa bem-intencionada iniciativa nos traria. Se Levi, por exemplo, conseguir pela música aumentar eficazmente a produção da popular dupla arroz e feijão, tão indispensáveis na mesa de qualquer brasileiro, quem sabe estará ajudando o governo a resolver sérios problemas de alimentação das massas. E massas têm tudo a ver com alimentação, não só porque gente come—e quanto mais gente, mais se come—como uma das coisas que mais as massas consomem são exatamente. . . massas. Que o digam os fabricantes e vendedores de macarrão.

Mas deixemos essas digressões sobre produtos alimentícios industrializados e voltemos ao que é natural, às plantas, a grande preocupação dos amantes da natureza e, às vezes, dos músicos. Quem sabe, uma sinfonia de Beethoven junto a milharais produziria milho de melhor sabor, ou a aplicação junto a esses milharais dos alegres sons da polca produziria milho com espigas já trazendo seus caroços em forma de pipoca. Seria bem prático: basta acrescentar sal a gosto e comer. . . Bem, seria aconselhável aquecer um pouco também. Até um nome sugestivo para tão extraordinário produto agrícola se poderia cunhar: “pipolca”.

Ou as fugas de Bach nos dariam melancias com menos água, pois esta pode “fugir” pelos canais vegetais rumo às raízes. Se aplicadas maciçamente isso haveria de ser conveniente nas regiões nordestinas, onde a água é meio pouca. . .

Por falar em nordeste, se a idéia pega e os nossos patrícios de Pernambuco resolverem adotar a metodologia levítica, (do Levi, não do livro bíblico) imagine-se eles pondo um frevo dos bem “quentes” junto às plantações de mandioca e essas já saindo na forma de farinha com casca protetora. Afinal, depois de se requebrarem tanto debaixo da terra, o trabalho dos moinhos seria dispensado.

O interessante será a aplicação de música em grande escala nas lavouras. Para tanto, alto-falantes no alto de postes, distribuídos em locais estratégicos em meio às plantações, poderiam transmitir música a gosto do freguês, ou melhor, das plantas. Os postes, logicamente, terão de ser de concreto—exigência dos ecologistas, e por boas razões.

O difícil é saber quais lavouras preferem o clássico, quais o tipo “easy listening”, o rock’n’roll, a bossa nova, o samba, o tango. . . Bem, este último ritmo servirá como uma luva para 'las manzanas', mas isso lá pelo território argentino, porque brasileiro, como todo mundo sabe, tem “birra” contra seus vizinhos do sul.

Seria interessante ver uma enorme quantidade de postes levantados por fazendas do interior paulista ou paranaense, com alto-falantes fixos no topo. Quantos seriam? Um, dois, três, quatro? Talvez quatro seja o ideal pois, afinal de contas, existem quatro pontos cardeais e cada um atenderia um desses rumos. Os pássaros logicamente a princípio vão adorar—são mais pontos de apoio para seus pousos e decolagens, ou para formação de ninhos, especialmente quando as árvores estão cada vez mais escassas do Oiapoque ao Chuí. Daí a exigência de que tais postes sejam de concreto. Agora, se o espetáculo musical começar muito cedo, certamente as aves não irão apreciar a concorrência, principalmente os galos nos terreiros.

A seleção musical para os vinhais deve se caracterizar por diferentes opções: as valsas de Strauss devem ser muito benéficas para os que produzem uva para vinho do tipo “suave”. Já as vívidas mazurcas de Chopin poderão ser boas para os que se especializarem em uvas bem vermelhinhas, para vinho tinto. E se puserem rock metálico pra valer, a conseqüência seria que as uvas já saem devidamente fermentadas. Isso pareceria uma grande vantagem, embora possa acarretar desemprego nas viniculturas e mais ébrios pelos campos.

Para os bananais das regiões litorâneas já há até uma musiquinha adequada. É uma antiga marchinha carnavalesca que certamente faria sucesso entre as bananas modernas. O nome é “Chiquita bacana” e fala que essa tal Chiquita, “lá na Martinica, se veste com uma casca de banana nanica. . .” Bem, pelo menos para as bananas nanicas parece bastante apropriada. O que dizer, porém, dos tipos de banana “maçã”, “prata”, “ouro”, “caturra”. . .? É difícil de imaginar, pois contamos com grande variedade de bananas no Brasil tropical, fato desconhecido pelos americanos que só importam o tipo “nanica” e o de cozinhar. E elas vêm de Porto Rico, Costa Rica, Honduras, Colômbia, não do Brasil, pois brasileiro não abre mão—dá é uma “banana” para os gringos que pretenderem levar nossos preciosos frutos que mal abastecem o mercado nacional.

Tanta variedade de banana é um privilégio tupiniquim, mas em termos práticos se constituiria num problema adicional para os amantes tanto de música quanto de banana, no caso da aplicação de um projeto músico-vegetal desses. Não deixa, pois, de ser um interessante desafio: encontrar a melhor música para cada diferente espécie.

Pode-se até prever o surgimento de um novo tipo de profissional: o disk jóquei rural bananeiro! Daí, apareceria também o DJ laranjeiro, o sojeiro (não necessariamente um sujeito sujo), o milhareiro, o batateiro, o cana-de-açucareiro. . . Enfim, um vasto campo para trabalhadores especializados se descortinaria. Afinal, se bem me lembro, nosso hino (atenção: não é 'nó suíno') pátrio não diz algo como “nossos bosques têm mais vida . . . nossos campos têm mais flores . . . “? O poeta se esqueceu das bananas, que daria mais variantes, mas, tudo bem. . .

Esses profissionais mencionados cuidariam da seleção musical para as diferentes plantas num trabalho que não acaba mais, chova ou faça sol.

E já que mencionei as flores, não podemos nos esquecer dessas plantas tão especiais e apreciadas: rosas, cravos, dálias, violetas, lírios, hortênsias, tulipas. . . Para as duas primeiras há uma velha canção que meninos e meninas de meu tempo cantavam em suas brincadeiras de roda. Não sei se ainda existem tais formas de folguedo infantil, ou se as crianças de hoje achariam graça em deixar seus video-games e joguinhos de computador para cantar, segurando as mãos em roda: “o cravo brigou c’o a rosa. . .” A dificuldade do disk jóquei floreiro seria encontrar algum CD que traga tal música, pois o velho disco de vinil disponível com a canção não servirá de nada—não existem mais vitrolas para tocá-la. . .

Enfim, deixando de lado essas reflexões saudosistas, incentivamos o Levi a prosseguir com seus estudos sonoro-herbais. Se o resultado lhe parecer indefinido, ele certamente poderá ao menos passar bons momentos desfrutando belos sons orquestrais, solo-instrumentais, corais, solo-canoros de seus artistas preferidos. E as plantas haverão também de apreciar os seus esforços. O problema é que não saberão como transmiti-lo, pois a linguagem das plantas ainda não foi decifrada em laboratórios que conhecem quase tudo sobre sua composição químico-física, mas não sabem nada sobre o que se passa em suas almas sensíveis.

Só os bons músicos, como o Levi, as compreendem a fundo.

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P.S.: Agora, falando sério, o Levi, que nos autorizou a divulgar o artigo acima, entendendo o “espírito da coisa” (pois é uma brincadeira) diz: “informo que as plantas que estavam sob influência da música erudita, cresceram 24% a mais, na média”. Assim, vemos que, embora não muito prestigiadas pelo público em geral, as plantas se dão bem com música clássica.

Quem sabe se todos se interessassem mais por Bach, Beethoven, Mozart cresceriam intelectualmente na mesma base?!