O cliente sempre tem razão?
Manoel era um homem magro, alto, calvo e grisalho com bigode, jantava na lanchonete ao menos duas vezes por semana e seu pedido era um dos pratos individuais mais requisitados da casa; contra filé à pizzaiolo com batata frita, acompanhado por uma lata de cerveja.
Chegava sempre cansado e reclamando do trabalho, mas garçonete dava liberdade para que ele falasse, esse que já não morava com os filhos e nenhuma das suas ex companheiras queriam contato, segundo ele; elas não deixavam o par de chinelos preparado quando ele precisava e muito menos serviam o prato na mesa como a mãe dele fazia quando ainda morava com ela e por isso os casamentos acabaram.
A garçonete escutava e servia, mas ela era paga para isso e aí está uma grande diferença.
Durantes semanas seguidas ele entrava pela porta preta de vidro com pressa para se sentar e ligar seu aparelho celular em sua série preferida; que nunca foi do interesse daquela garçonete saber qual era, mas sem nem precisar levar o cardápio até a mesa o recebia com sua lata de cerveja até que o prato ficasse pronto.
Sempre a mesma rotina com aquele cliente;
cerveja, série no celular, prato servido, mais uma cerveja e reclamações de suas antigas e também das novas parceiras.
Em alguns momentos aquela garçonete que também era uma mulher, se sentia mal com a colocações que ele levantava naquela mesma mesa de sempre, a mesa um.
Em uma quinta-feira qualquer, seguindo a rotina de chegada e permanência, Manoel perdeu a linha e antes de ir até o caixa para acertar a conta, se achou no direito de comentar sobre a aparência daquela garçonete.
"Você está mais fortinha de uns dias para cá..." antes que ele continuasse, a garçonete olhou bem no fundo dos olhos dele e disse que ninguém tinha o direito de opinar sobre o peso tem outra pessoa; principalmente no de uma mulher.
Manoel, fingindo não ter entendido, prosseguiu com sua colocação totalmente desnecessária; "mas eu ia dizer que você está mais bonita assim, só que hoje em dia não se pode falar mais nada, qualquer coisa se torna uma ofensa. Também não digo mais nada para você".
Então a garçonete já cansada e sabendo que poderia ter problemas no trabalho; terminou a conversa; "por isso que seus casamentos acabaram, você não sabe ouvir uma mulher", se virou e foi limpar a mesa.
Naquele dia a lanchonete estava vazia, nenhum outro cliente havia escutado aquela conversa que poderia ser analisada como uma falta de respeito da garçonete, segundo aquela frase; o cliente sempre tem razão.
Final de expediente, e a funcionária que nunca teve uma reclamação por seu atendimento, deixou seu chefe por dentro do que havia acontecido, foi escutada e naquela noite foi embora do trabalho agradecendo pela experiência como garçom que seu empregador havia exercido antes de ser dono do estabelecimento.
Já Manoel, só faz pedido pelo telefone e quando está pronto, entra na lanchonete, deseja uma boa noite e leva seu jantar agora em marmitas de isopor; e seguindo seu ciclo de relacionamentos, onde até mesmo a mulher que estava ali para o servir, desempenhou seu papel como as outras, fazendo-o se retirar.