A cerca da mutabilidade das coisas (Diferentes fases de 28 de outubro)
A cerca da mutabilidade das coisas (Diferentes fases de 28 de outubro)
A vida é recheada de transitoriedade. Nela, nada é estanque. Um dia tempestade, no outro sorrisos de arco-íris. Assim como para todo o ser vivente, a vida também reservava para ela uma abrupta surpresa.
Era vinte oito de outubro de 2023. O tédio corroía o seu sábado. Ela já não sabia mais o que fazer para preencher aquele dia tão solitário. Tentou ter um encontro, mas se sentiu ainda mais sozinha na companhia daquele rapaz. Ligou para algumas amigas, mas todas estavam em compromissos inadiáveis. Então, depois de tantas frustradas tentativas, caminhou pela praia rumo a sua casa.
No fone, James Blunt embalava os passos, e a mente memorava todos os possíveis erros que podiam ter culminado para o desastre dos últimos dias.
Não havia nada de errado, ela só precisava passar por aquela fase cinza.
A solidão que outrora era companhia intermitente, agora estava agarradinha nela, e junto aos seus pés subia a escada do prédio, abria a porta e se esparramava no chão do quarto dela.
Os olhos, copiosamente, choravam a repetida canção, e as mãos seguravam um livro que era quase um imperativo para a transição daquela fase. “A hora de parar de chorar”, o programa cotidiano de todo sábado. Ela lia na esperança de um dia conseguir sorrir. Esperava um dia não passar mais os seus finais de semana lendo a história para sua solidão.
Sua mente cansada não conseguia vislumbrar outro cenário, achava que o resto dos dias seriam sempre iguais, até o dia que...
Era vinte oito de outubro de 2026. A agitação sacodia o seu sábado. Já tinha feito tanta coisa, e o tempo não era suficiente para dar conta de tantas demandas. Ela cozinhou uma bela refeição, pôs a mesa e comeu com a sua família, escolheu uma roupa confortável enquanto seu marido lava a louça, se vestiu, arrumou seus filhos, foi ao shopping, sentou ao lado de seu amado e se maravilhou ao ver a alegria dos meninos brincando.
A noite chegou, e ela voltou para casa, olhou para seu antigo livro na estante, lembrou dos choros de sábado, e riu, percebeu que as mãos que outrora seguravam aquele exemplar, naquele exato momento ninavam seu menininho. Viu também o chão que abrigou tantas de suas lágrimas, e agora era colorido pelos mini carrinhos de seus amores.
Os olhos fechadinhos se aconchegaram no ombro do amor, e a canção aqueceu os abraços. No meio do ninho, ela se deu conta que feito as águas, as fases ruins também passam, e sempre há um novo capítulo a ser escrito.
O calendário marcava o mesmo 28 de outubro, mas a vida já não era a mesma.