Temperança e Hybris

Os Gregos antigos prezavam muito a vida em comum. Para eles a vida pública, política, era mais importante que a vida privada. Esta vida pública era compartilhada nos espaços da cidade e, penso eu, é um dos motivos para que a filosofia Grega construa um conhecimento baseado na coletividade e no respeito ao outro.

Acreditavam que a felicidade se traduzia em uma vida equilibrada, comedida, temperante. Traçando uma linha, em um extremo estaria o excesso e no outro a falta, o equilíbrio estaria no meio desta linha. A temperança é o equilíbrio, sem tender nem para o excesso e nem para a falta. É a justa medida. Seu oposto é a hybris, o excesso, o destempero, a falta de medida. Ainda para os Gregos, a virtude depende do autocontrole e do autoconhecimento e é um dos caminhos para se alcançar a sabedoria.

Comecei esta crônica com estas definições para comentar sobre a raiva. Não é a toa que a ira está entre os sete pecados capitais. Sabe aquela frase “fulano me tira do sério”? Você tenta se controlar, promete a si mesma não se abalar e em um instante, lá está você, parecendo um vulcão, derramando fogo pela boca e dizendo coisas horríveis que, com certeza vai arrepender. Na raiva você está em poder da hybris e não deve agir e nem dizer nada para não se arrepender depois. E vivemos este ciclo de raiva-hybris-calmaria- temperança. Como e onde ficar no meio da linha? A imagem é boa, é só uma linha que nos separa dos opostos.

Como assistir placidamente a esta explosão atual de dever-ser, todos são especialistas e entendem muito de todos os assuntos. E na explosão de raiva, quando tudo passa nos perguntamos o que aconteceu? Porque disse tantas bobagens? O que eu e as outras pessoas ganham com isto tudo que eu disse e fiz? E me prometo ser temperante até a próxima explosão.

Quando os Estóicos transitavam neste mundo existia menos pessoas, menos meios de se comunicar e menos patrulha nas ações e palavras. Eles estavam e estão certos quando diziam que o auto controle é de dentro para fora. Se estamos seguros com nossos pensamentos e emoções não existe hybris. Toda vez que perco a calma, quando me estabilizo tento entender o que aconteceu, porque esta reação, porque existem pessoas que afloram em você o seu pior lado, porque acho que tenho o direito de dizer coisas ruins para outro ser humano. Estas respostas serão a chave do meu auto controle, que me levará ao auto conhecimento e que me levará à sabedoria. Fácil né? Os estóicos conseguiram!

Existe o outro extremo da linha, somos também destemperantes quando não reagimos. Ver as coisas aconteceram e não dizer nada, ficar em silêncio comtemplando o caos também é hybris. Posso não reagir quando vejo uma injustiça? Quando percebo algo muito errado? Quando tenho certeza que posso ajudar? Esta apatia também gera problemas, às vezes mais sérios do que a ira. Termino como comecei, o problema é a justa medida, o equilíbrio dos extremos.

Márcia Cris Almeida

17/01/2022