ENCONTROS INTERMINÁVEIS
Em nossas casas promovíamos encontros de muitas horas, com a desculpa de fazer um churrasco, muitas vezes o dia era curtido na íntegra. Começava cedo, para encontrar aquele corte ideal da picanha, a costeleta de porco e também marcava presença a favorita das esposas e crianças: coxas, sobre coxas e coração das penosas.
O limão tinha seu valor reconhecido, tanto acompanhado de cachaça, como dando aquele requinte gourmet às carnes ditas brancas. O queijo coalho e os pãezinhos recheados com alho e maionese torrados serviam como entrada, enquanto proteínas gradativamente ganhavam, cor, cheiro e sabor.
Depois que o Paulo nos apresentou o carvão de churrascaria, descartamos para sempre os normalmente expostos nas prateleiras dos supermercados. Essa tipologia tem formato de cilindro, variando apenas de tamanho, suas principais propriedades são: não levantar labareda e permitir duração prolongada.
As experiências com cortes da carne, principalmente a bovina, serviam de abre alas do processo de degustação de cervejas exóticas e cachaças dignas de deuses.
O Paulo, como maior apreciador de cachaça, respondia com prazer por esse quesito do cardápio. Já o Bruno, fanático por cervejas, não se fazia de rogado, sempre tirava do chapéu uma novidade para dividir a degustação.
Minha casa em Santa Teresa era palco predileto para esses encontros, na sombra da frondosa Pata de Vaca e o olhar atento de passarinhos que não mais se inibiam com nossa presença.
Essa maratona de cores, cheiros, texturas e sabores apenas tinha horário de início dos trabalhos. Para nossas companheiras, a festa ficava à altura, pois minha esposa Soninha e a Silvia eram irmãs e Andrea trabalhou com a Soninha por muito tempo, e a identidade era tanta, que praticamente se convertera em irmãs.
Cada um dos casais coincidentemente contava com dois filhos em idades relativamente próximas, o que também permitia ao grupo maior, se divertir em conjunto, facilitando e como, a cada um dos três grupos, um relaxamento sem precedentes.
As horas passavam de forma tão natural, que apenas o sol, ou melhor, a ausência dele, nos lembrava da necessidade de acionar a iluminação da casa, despertando para a realidade das horas, que independente da vontade, permeia nossa rotina do cotidiano.
Outro robusto indicador de tempo passado era a premente necessidade de sentar, mas claro, apenas quando as pernas não aguentavam mais, pois enquanto essa fadiga não incomodava, longas digressões mostram-se mais enfáticas, se perpetradas de pé.
Essas tertúlias invariavelmente tinham como pano de fundo a música popular brasileira, um consenso do grupo. Os anos passavam, ora outro convidado se integrava às degustações, mas nós três nos mantínhamos impávidos e coesos, tanto na obrigação de preparar o melhor churrasco, como também na implicância/gozação com nossas respectivas esposas.
Logo um novo encontro ficava marcado, e tudo se repetia de forma inédita, pois entre amigos, sempre existe o que conversar, ora relembrando situações esdrúxulas passadas em comum, ora aquelas que ficaram efetivamente para nossas vidas.
Nesses momentos especiais também se planejava ou mesmo especulava sobre viagens futuras a destinos variados, pois naquele momento, filhos necessariamente estariam nos acompanhando e claro, precisavam de atividades compatíveis com sua faixa etária.
Conseguimos muitas vezes concretizar planejamentos de curto prazo, infelizmente os de longo prazo, ficou restrito apenas às mulheres. Eu perdi essas duas referências de companheirismo num curtíssimo espaço de tempo, ambos partiram precocemente, com menos de 60 anos, por mortes definidas como naturais.
Nossos encontros intermináveis e nossas infindáveis trocas de ideias se esvaíram como fumaça, levando junto alguma parte de mim, que ainda não sei bem avaliar.