TRIBUTO AO SAUDOSO AUDITOR FISCAL JOSÉ MARIA BARBOSA
O sentimento mais profundo que existe, é a gratidão. Não reconhecer o que alguém fez de bom por você, é renegar o amor, é não ter capacidade para amar. O texto ora apresentado, é mais do que um agradecimento, é a crônica eterna da gratidão, é um tributo a uma pessoa excelente com quem tive o prazer de trabalhar por algum tempo, o saudoso Auditor Fiscal Zé Maria Barbosa. Um ser humano ímpar, de fácil diálogo, compreensivo e atencioso.
De diversos assuntos tratávamos, mas tema preferido de Zé , além de futebol, corintiano fanático, era literatura, principalmente poesia , se dizia bom poeta, porém, alguns poemas que li dele ou mesmo ele recitou , eram muito ruins, achava que era um rabiscador de papel . Isso eu dizia a ele, que sorria: - “Ora, Juclito, poeta é você! Adoro suas poesias , bastante inspiradas, muito bem escritas e atuais . .Além do mais, você é um ótimo declamador."
E pedia para eu declamar alguns dos meus versos e também que eu recitasse algumas poesias de Castro Alves , Casimiro de Abreu, Fernando Pessoa , Álvares de Azevedo, Gonçalves Dias, Gregório de Matos , Augusto dos Anjos.
Do itabunense , Firmino Rocha, declamei diversas vezes “ Deram um Fuzil ao Menino”, poema que está inserido numa placa no Panteão da ONU.
DERAM UM FUZIL AO MENINO
“Adeus luares de maio
adeus tranças de Maria.
Nunca mais a inocência
nunca mais a alegria,
no coração do menino.
Agora é o tambor da morte rufando
nos campos negros.
Agora são os pés violentos ferindo
a terra bendita.
A cantiga, onde ficou a cantiga?
No caderno de números o verso
ficou sozinho.
Adeus ribeirinhos dourados.
Adeus estrelas tangíveis.
Adeus tudo o que é de Deus.
Deram um fuzil ao menino”.
Que tempo, meu amigo , Zé
Quando soube que eu apenas tinha feito supletivo, me incentivou para eu estudar, fazer um curso superior.
Agradeço a Zé, a orientação, o bom conselho, o incentivo, algo decisivo para eu me predispor aos estudos, concluir formação superior e posteriormente, pós-graduação em área de interesse da SEFAZ.
O Zé Maria era Auditor concursado. Mais um amigo, do que um chefe de equipe do Agente de Tributos no período em que costumava ser chamado o Auditor Fiscal que chefiava a equipe de ATEs Auditor-Chefe.
Ele era um contador de casos excelente. Um gozador nato, sem ser chato. E quando o Corinthians ganhava , era aquela gozação em cima do torcedor do time adversário. O Palmeiras era o time que Zé mais detestava, seguido do meu Flamengo.
Eu puxava assunto. O instigava a contar uma daquelas histórias pitorescas - casos em que era protagonista de histórias mirabolantes— assuntos variados que versavam sobre diversos temas , dos quais se destacava os preferidos dele: filmes de terror, suspense, comédia , contos de assombração, de milagres, não esquecia de abordar sempre, com entusiasmo , as maravilhosas viagens que fez por quase todos os recantos do Brasil , recordava com nostalgia , as conquistas, e lamentava os amores não correspondidos.
Era uma pessoa alegre, expansiva, brincalhona, gostava de cantar e se arvorava , a imitar Orlando Dias , de quem era fã. Mas a voz de Zé era bastante feia: " parecia um disco rasgando, o ronco de um motor velho”.
Para me tirar do torpor de ouvi-lo cantar , com a voz trovejante, rasgada, eu insistia para que ele me contasse uma das muitas histórias que sabia contar como ninguém, lógico que o Zé Maria exagerava na dose, e narrava histórias intermináveis , floreando bastante para chegar ao finalmente.
Quando eu pensava que ele já dera por encerrada a narrativa , começava outra história, mudando de assunto para Fiscalização que girava em torno das peripécias dele , os casos em que era protagonista.
Ficava horas e horas a escutar suas narrativas, sempre contadas com graça e certa ironia, nas quais fazia questão de dizer que algumas eram de autoria dele , e a maioria , ouvidas de alguns colegas fiscais, com quem havia trabalhado.
Zé se orgulhava de ter uma memória privilegiada, de ser um bom intérprete de qualquer história, por dominar qualquer assunto, inclusive, sobre o Fisco desta grande Bahia, de excelentes poetas, exímios cantores e compositores, ótimos escritores e malucos-beleza como eu.
As histórias que contava eram do arco da velha. Remontavam 1966, quando das nomeações de Juracy Magalhães, verdadeiras artimanhas governamentais com nomes bonitos, era crítico das transformações de cargos (anos 80) , e se referia às vezes , com extrema ironia, à TRANSPOSIÇÃO dos EX-ANALISTAS ( paulada na Constituição Federal de 88 ) , levantava questão sobre os APOSTILAMENTOS , dos quais dizia ter sido aberta a porteira por Benito Gama, onde algumas pessoas estranhas à fiscalização, foram elevadas a auditores fiscais. Porteira extensa aberta.
Como ele odiava hipocrisia, chamava atenção para aqueles que foram beneficiados com algum arranjo governamental do tipo transposição, ou outro nome que lhe fosse dado, e se achavam no direito de se interporem no caminho de determinada categoria, alegando ilegalidade , trem da alegria de uma Lei em curso, proposta pelo governo com o fito de ajeitar a sua máquina funcional , para torná-la mais dinâmica e eficiente, simples reestruturação de cargos semelhantes ou aproximados , com a mesma identidade funcional, pertencentes à mesma carreira , em se falando do Fisco baiano, isso , Zé Maria veementemente criticava, chegava ao ponto de se zangar com determinadas pessoas de determinado grupo , que eram contra a evolução da carreira do Agente de Tributos por pura sacanagem, cinismo, falta de bom senso e , mesmo , por serem pessoas desavergonhadas, que atacavam os ATEs, sem que se mirassem no próprio espelho , em razão de aquelas criaturas serem contra qualquer medida governamental que viesse a beneficiar os Agentes de Tributos e terem o rabo preso em algum TREM DA ALEGRIA , ou terem irrompido pelo boqueirão - a parteira aberta por Benito Gama , por onde entraram balanceiros, motoristas, servidora de café e outros levados no trampolim dos chamados APOSTILAMENTOS que viraram Auditores Fiscais.
Foi um número significativo dos que entraram pela porta dos fundos da SEFAZ/BA.
Mas para ele , os piores, os que mais sentavam o malho contra o ATE , eram logo os que não deveriam fazê-lo , por não terem feito concurso público para Auditor Fiscal , os EX-ANALISTAS FINANCEIROS.
Quanto ao cargo de Agente de Tributos, elogiava o nosso desprendimento, o nosso esforço para galgarmos evolução na carreira através estudo, incessante procura por melhor qualificação técnico -funcional e escolar.
Dizia nos elogiar e nos admirava por ter visto o nosso esforço para evoluirmos no cargo . Fazia questão de afirmar: que seguiu passo a passo todo desenrolar da criação do cargo de ATE - no princípio como auxiliar à fiscalização e tendo como atividade principal - ARRECADAÇÃO , no período em que o espontâneo valia ponto para o ATE fazer o teto na gratificação fiscal , por isso, chamado de ARRECADADOR.
Era dos poucos, que nos ajudava no balcão e talvez o único que dividia plantões noturnos conosco. Algumas vezes, entregava o plantão para que viajássemos, pois alguns de nós, morávamos distantes de onde estávamos trabalhando :Argolo (Alberto Santana) ou Mucuri ( Eduardo Feire).
Numa das conversas que tive com ele, Zé Maria disse- me algo, que há muito, eu também tinha a mesma impressão: 0 Auditor Fiscal é corporativista, puxa a sardinha para a própria brasa . Não se escuta auditor falando mal de auditor. Um ao outro não se intriga. O AF se auto protege protegendo seus pares. Diferentemente de alguns ATEs, que estão longe disso.
Fico encucado com atitudes de alguns Agentes de Tributos, que agem como se fossem iafianos. Impunham mesmo, a bandeira desses. Só não estão fazendo parte do instituto , porque não foram aprovados para o cargo de Auditor Fiscal.
Percebe-se , que , em algumas vezes , por atitudes manifestas, não paira dúvida, que há Auditores Fiscais que foram Agentes de Tributos , que são um dos maiores opositores aos ATEs .Que tudo que estiver aos seus alcances fazem , para impedirem qualquer benefício ao Agente de Tributos. Parece sentirem vergonha dos antigos colegas.
O Maria, como eu tinha costume de chama-lo, e Zé se chateava momentaneamente comigo, depois sorrindo falava: - “Você não tem jeito, seu Juclito, eu sou alguma Maria? Sou macho, cara! Muito macho! O Maria do meu sobrenome é macho"!
Zé tinha uma memória muito boa, coisa que facilitava sua narrativa precisa, segura, sem esquecer nenhum detalhe de algumas reestruturações ocorridas no âmbito da Administração Fazendária baiana. E sempre se referia a essas restruturações, para justificar que o cargo de Agente de Tributos deveria, sim, sofrer aliteração em sua estrutura , para melhor adequá-lo à carreira fiscal , assim como foram remanejados em 1981, os cargos de Fiscal de Rendas, Fiscal de Rendas Adjunto , unificados à carreira de Auditor Fiscal . Já em 1989, quando a Constituição do nosso País ( 1988) , não mais permitia , a transposição de cargos. Os EX-ANALISTAS foram agraciados com o cargo de Auditor Fiscal . Ninguém reclamou de um ato que foi de encontro à Constituição Federal.
Sempre, quando podia, Zé nos ajudava em nosso trabalho - dividindo tarefas , compartilhando plantões conosco.
E de tudo que ele conviveu , presenciou e teve satisfação tamanha , foi ver o ATE crescer profissionalmente por méritos próprios , porque fez por onde, substituindo o Auditor Fiscal em algumas atividades mais complexas, que eram privativas desse , as desempenhado de forma eficiente, competente, profissional e responsavelmente.
Zé Maria era um homem justo e reto , que sempre ia estar do lado do Direito , da razão , da justiça . E essa razão e direito e justiça, avaliava estar com o Agente de Tributos, motivo pelo qual, por sua retidão, o impelia a arregaçar as mangas da camisa e estar coeso com os ATEs - dividindo tarefas com eles , se reversando nos plantões fiscais , ora do ATE , ora dele.
Era enfático em reconhecer, que a razão estava com o ATE , que evoluiu dentro da mesma carreira, à qual se submeteu a concurso público, não pongando para um cargo estranho à sua origem. Isso não aplicável a determinados cargos na própria SEFAZ da Bahia, cujos diversos remanejamentos alocaram servidores de outra secretaria à fazendária.
Era daqueles, que por ser auditor-chefe no plantão fiscal, não achava justo, ficar recanteado, aguardando que o Agente de Tributos lhe trouxesse tudo mastigado para apenas lavrar o auto de infração. Participava ativamente, do início à conclusão de toda ação fiscal.
Não ficava de braços cruzados. Fiscalizava de fato. Ia para o balcão. Detinha a nota fiscal, a analisava, dialogava com o Agente de Tributos, se era cabível ou não a autuação … Assim era Zé Maria.
Zé se orgulhava de ser um bom aluno, ter absolvido como funcionava os meandros da SEFAZ/BA. Isso por ouvir histórias do Fisco e saber contá-las. E por ser ouvinte assíduo do EX-BALANCEIRO , Zé Pires, que virou Auditor Fiscal , na época dos APOSTILAMENTOS de Benito Gama , Zé Maria vivia a imitá-lo com gestos iguais aos de Zé Pires e imitando-lhe a voz: " Sou do tempo do onça. Do tempo que não se exigia formação alguma para ser fiscal na Bahia. Do tempo em que o governador nomeava os seus fiscais conforme conveniência política, tipo pistolão. Quem era amigo do governador, ou amigo do amigo , virava fiscal. Não importava se tinha formação escolar ou não.
Ora, ora! Negócio de constituição do crédito tributário, nem se sabia o que era isso. Em 78 , é que veio a constituição do crédito tributário e nível superior para o cargo de Auditor Fiscal".
Uma grata lembrança, deste relato que faço com emoção, com alma e coração repletos de gratidão --mais do que um agradecimento, um tributo ao saudoso José Maria Barbosa, mais do que um amigo, um irmão, um companheiro!
Saudade, amigo! Sei que está em bom lugar , por ter sido uma pessoa elevada, honrada, de bons sentimentos e humanitário!