Breve História de Amor

Me surpreendo com algumas situações de cotidiano, e algumas acho interessante registrar.

Estava eu ontem, na casa dos meus pais, em rápida visita. Eles estavam comemorando 36 anos de casados, então, como único filho, minha presença era necessária.

Enquanto eu respondia alguns emails de clientes pelo celular, chegou um amigo do meu pai trazendo o sogro. Um senhor de 81 anos, que curiosamente faria aniversário no outro dia.

Comecei a conversar com aquele senhor, que se chamava Almerindo. Ele muito simpático, e como bom vendedor, era bom de papo. Me contou sua vida inteira naqueles breves momentos de diálogo. Eu gosto de ouvir histórias, talvez seja por que sou um contador de histórias também. Entre todo o diálogo, o que me chamou a atenção foi ele confessar que tinha 62 anos de casado, sei que é muito tempo. Então ele me disse que conheceu sua esposa quando tinha 19 anos. Viera da Bahia, em busca de emprego e oportunidades no Espírito Santo, e foi parar na cidade de Pinheiros. Dizia ele que quando lá chegou, foi hospedar-se na casa de seu irmão mais velho e com isso conheceu a irmã mais nova da esposa do irmão. Ele sorria dizendo que fora amor a primeira vista. E a garota, na época com 16 anos se encantou por ele também imediatamente. Se apaixonaram um pelo outro na primeira vez que se viram, uma história tipo conto de fadas de livros infantis, só que real.

Contou ainda que o pai da moça não queria que ela se casasse com ele, pois ela tinha um pretendente que era filho de um rico fazendeiro, e essa era a opção do pai. Só que a paixão não segue a razão ou os padrões impostos por outras pessoas.

Surpreendente, para os padrões da época, foi a reação da moça, que disse que se não fosse com o Sr Almerindo, ela não se casaria com ninguém. Eles se casaram poucos meses depois. Ele contava isso com um sorriso orgulhoso no rosto. Tiveram seis filhos juntos, três mulheres e três homens.

Contou-me todas as dificuldades que passou durante a vida, detalhando como era cada filho e filha. E completou me dizendo que teve tantos problemas que não fazia conta, os que se lembrava eram : câncer de próstata, pedra na vesícula,hérnia e hipertensão arterial. Me disse ainda, sem eu perguntar, que desde a operação do câncer de próstata em 2009, ele precisava usar fraldão, devido a incontinência urinária, e tomava vários remédios todos os dias. E isso nunca o impediu de vender suas verduras nas feiras da cidade.

O que chamou mais atenção foi a maneira como ele narrava os fatos, não era reclamando. Dizia que todas as pessoas tem as suas dificuldades, e aquelas eram as dele. E que como tinha muita fé em Deus, passava por tudo dando glória a Deus. E sempre tinha uma passagem bíblica decorada para encerrar sua frases.

Contou-me também que a esposa tinha muitos problemas de saúde, e que eles cuidam um do outro. O carinho que ele tinha pra falar dela era evidente. Demonstrou, sem ter a intenção de dar lição em ninguém, que o casamento é passar por todas as situações, sejam boas ou difíceis, de mãos dadas, um apoiando o outro.

Essas foram as palavras dele, impressionantes. Uma lição de vida, gratuita e num momento inesperado.

Interessante ainda é saber que ela foi a sua primeira e única namorada e esposa durante toda a sua vida, e ele estava muito satisfeito com isso. Evidentemente, tinha acertado na primeira, isso é muito raro, beira mesmo o impossível hoje. Ela era o primeiro amor dele e ele era o primeiro amor dela. São de uma época de amor sólido e duradouro, ao contrário de hoje que são tempos de amores líquidos e breves.

Um casamento em que os dois trabalharam muito em lavouras, não fizeram fortuna, mas passaram por todas as dificuldades juntos, e foram e são ainda felizes um com o outro, por todos esses anos.

Me prendi tanto aos detalhes da história, que esqueci de perguntar o nome da esposa dele. Uma trivialidade que não permite diminuir o valor e a lição aprendida com essa história. Mesmo assim vou lembrar de perguntar o nome da esposa dele na próxima vez que nos vermos, que segundo ele é sábado que vem, pois prometeu trazer um cacho de bananas de sua roça, pra mim. A generosidade é uma outra nobre e rara característica das pessoas da época dele, mas isso é assunto pra outra hora.

Abreu Lima
Enviado por Abreu Lima em 26/10/2023
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