UM MERCEDES-BENZ ESPECIAL
Em Lisboa, longe de uma boca de metrô, optei por tomar um táxi, minha filha devia naquele momento, estar desembarcando no aeroporto de Portela, na freguesia de Olivais, e não queria deixá-la me esperando por muito tempo.
No caminho o motorista angolano super falante, enquanto dirigia, me contava sua história de vida. Mecânico em sua terra natal se transformara em motorista de coletivo na capital portuguesa.
Fazia cinco anos que mudara de vida, e para melhor. Nesse quinquênio galgara a condição de sócio minoritário de uma empresa de táxis local.
No início, por indicação de um conterrâneo, conseguiu a vaga de motorista na mesma companhia. Utilizando seu apurado faro de mecânico, conseguia descobrir e prontamente relatar ao proprietário problemas no veículo que acabara de dirigir.
Logo, seu João Rodrigues, chefe e dono da empresa sacou que dali poderia nascer uma bela parceria. E não se fez de rogado, dando linha à pipa, Manuel Tavares foi alçado ao cargo de testador oficial de veículos da empresa.
Cada um dos vinte Mercedes que compunham a frota, agora passaria pelo menos dois dias sob seus cuidados, ou seja, no turno diário de oito horas de direção, faria anotações sobre o desempenho e possíveis problemas encontrados no carro.
A partir da chegada desse imigrante africano, a empresa praticamente não perdia mais tempo útil de veículos na oficina, e mesmo nas revisões agora preventivas, o carro já entrava na oficina com laudo técnico completo, o que acabava acelerando o serviço dos mecânicos da empresa terceirizada.
Manuel agora detinha participação de 20% dos lucros da transportadora. Tinhoso como ele só, parou de dirigir por seis meses e foi se aprimorar numa loja especializada em lanternagem e ajustes das partes internas de veículos.
A partir desse momento, seus laudos não mais se restringiriam a mecânica do veículo, agora, muitas vezes ele mesmo se incumbia de dar solução aos problemas mais simples, para os complexos firmara um convênio com a loja onde fizera seu aprendizado.
Seu João, ainda contava na frota com o primeiro carro que dirigiu, na época, ainda no papel de diarista de uma empresa de táxi, e por acaso, esse era o talismã que me conduzia ao aeroporto, um velho Mercedes-Benz preto impecável, do alto de seus mais de um milhão de quilômetros rodados.
Orgulhoso de conduzir o carro icônico do chefe, me solicitou encontrar algum detalhe que parecesse desgastado no interior do veículo, ou algum ruído de suspensão, algo que seria natural para um táxi com tanta quilometragem rodada. Fiz um esforço danado e concluí que realmente, se bem tratado, esse carro alemão pode durar por tempo bem elástico.
Nem senti o tempo passar, ou mesmo a paisagem se alterar enquadrada pela janela do velho Mercedes-Benz, apenas agradeci ao solícito motorista, pela bela história com final feliz.