Fracasso instrutivo
Tinha 33 anos, embora ainda fosse muito parecida com Ana Paula Arósio. Também, a essa faixa etária, ainda era solteira, e todos nós, seus admiradores discretos, secretos e tímidos, perguntávamos como, se era muito parecida com a Ana Paula Arósio?
Era também linda, de uma beleza muito assemelhada à lindeza sabe de quem? Exato: à da Ana Paula Arósio. Seu rosto, suas sobrancelhas, seus traços corporais lembravam visualmente o rosto retilíneo, as sobrancelhas escuras, os traços corporais fortes e vigorosos adivinha de quem? Perfeitamente: os da Ana Paula Arósio.
Era parecidíssima com Ana, como quase todos da cidade dois mil habitantes, com exceção do senhor pároco, sabíamos, mas não qualquer Ana, senão a Ana Paula Arósio. Apesar de parecer-se muito com Ana Paula Arósio, nem tudo eram flores e beleza na vida de nossa admiradora. Pesquisamos, investigamos, descobrimos afinal que a nossa Ana Paula Arósio sofria de uma condição terrível: não sabia andar de bicicleta.
Isso foi há quarenta anos, ocasião em que bicicleta era o principal meio de transporte. Decidimos ajudar. Fez-se uma "vaquinha", alugou-se uma bicicleta, em seguida houve um sorteio público para escolher quem seria o corajoso a oferecer-se como instrutor à nossa Ana Paula Arósio. Eulálio seria o sortudo, se não fosse um detalhe: Eulálio também não sabia andar de bicicleta.
Houve um segundo sorteio, que teve como vencedor o Etevaldo, mas o Etevaldo sofria do coração e, infelizmente, por recomendação médica, teve que desistir da missão. Seguiu-se um novo sorteio, em que houve suspeita de fraude, cujo "sorteado" foi o Ediburgo. Houve bastante comemoração da parte de Ediburgo, e oficialmente nem um impeditivo: Ediburgo tinha "ganhado" o sorteio, Ediburgo sabia andar de bicicleta, Ediburgo não sofria fisicamente do coração.
Lá foi Ediburgo à casa da nossa Ana Paula Arósio, com a finalidade de convidá-la a instruir-se na complicada arte de andar sobre duas rodas. Chegou, montado na bicicleta alugada, desceu, bateu palmas, apresentou-se, cumprimentou o senhor e a senhora Arósio, pediu-lhes permissão para instruir Ana na complicada arte de andar sobre duas rodas. Ambos consentiram, Ana também.
A nossa extraoficial Ana Paula Arósio, apesar de toda dedicação empreendida, não apreendeu a dificílima arte, mesmo depois de quarenta e quatro aulas e trinta e quatro quedas.
Isso foi há quarenta anos. Hoje ela continua analfabeta na difícil arte de andar sobre duas rodas. Mas não está mais solteira. Casou-se. Adivinha com quem? Com Ediburgo, claro, e vive satisfatoriamente bem, dona de lar, no interior de uma cidade de dois mil habitantes, contando com o vigário.
Quanto a Ana Paula Arósio oficial, segundo informações catalogadas no GPS, vive reclusa, anônima, no interior da Inglaterra, dedicando-se integralmente à criação de cavalos. Vivendo possivelmente um excelente fracasso instrutivo.