ERVEIROS

Diante da nova determinação do ministério da saúde no sentido de incluir os curandeiros no sistema nacional de atendimento básico, tal como a fênix mitológica, os erveiros devem ressurgir nos mercados públicos de todo esse Brasilzão, mas penso eu, nenhum deles se igualará ao seu Zé.

Instalado num cubículo do Mercado de São José no Recife/PE, aquele homem baixinho (padrão dos nordestinos até o último quarto do século passado conforme descreve o Dr. Josué de Castro), com um dente de ouro no incisivo inferior, usava invariavelmente um chapéu de aba curta e cor indefinida, roupas simples, sempre limpas e alpercatas do tipo “xô boi”.

Como nenhum outro, ele sabia as qualidades terapêuticas e as técnicas para tirar proveito daquela infinidade de ervas que enchiam as prateleiras, cestas, vasos, gavetas e caixas dispersas de tal forma que somente ele saberia dizer onde se encontrava o que o cliente estava procurando.

Raízes, bulbos, cascas, entrecascas, ramos, folhas, flores, frutos e sementes de plantas identificadas apenas pelos nomes vulgares da região, frescas, secas, picadas, moídas em infusões individuais, nas garrafadas de multiervas e outras tantas formas de apresentação enchiam aquele espaço de cheiro característico e inconfundível.

Também faziam parte desse universo curativo, ossos, chifres, língua de pirarucu, baiacu, estrela do mar e cavalo marinho secados ao sol, chocalho de cascavel, mel e cera de abelhas nativas sem ferrão, sal grosso, breu, enxofre, piche, espermacete, sebo de carneiro capado, gordura de tartaruga, de teiú ou boto do Amazonas.

Para os males de quaisquer origens, perebas, verminoses, fraqueza de sangue, mal de mulher ou impotência de homem, seu Zé tinha o remédio e, com paciência de monge tibetano, explicava nos mínimos detalhes, como as pessoas deviam agir, o tempo de descanso necessário para a cura do preparado antes da sua aplicação, detalhando o número de dias para aquelas mais trabalhosas que precisavam ficar o tempo todo no escuro, expostas ao sereno da noite, mas protegidas das chuvas e recolhidas antes do sol nascer além de todos os cuidados com a alimentação e o resguardo durante a aplicação das meizinhas.

Mas esse conhecimento empírico, trazido dos confins dos tempos pela tradição oral está irremediavelmente perdido por conta da universalização do atendimento médico, que apesar de todas as suas deficiências, resolve a maioria dos problemas e, vamos combinar, não nos dá trabalho nem requer atenção constante.

CITAÇÃO

Josué de Castro em Geografia da Fome/ Homens e Caranguejos