As Flores e eu
Desde muito cedo percebi que havia em mim uma ligação muito forte com a natureza. Tive a influência de meu pai que sempre cultivou hortaliças nos quintais das casas em que morávamos.
Mais tarde, aposentado, pôde realizar seu sonho de ter um sítio e criar galinhas poedeiras, porcos e uma única vaca, cuja produção de leite era para o consumo da nossa casa. O mais importante, entretanto era a plantação de hortaliças. Ali se plantou e colheu de tudo, alface, couve, beterraba, cenoura, berinjela, tomate, pepino, salsa, além das frutas de estação e de flores que contornavam a estrada de chegada.
Foi nessa época que estive muito ligado ao sítio, e me lembro bem do dinheirinho extra que arrecadava com a venda de caixas de tomate e de verduras.
Lembro também do moinho d’agua construído pelo carpinteiro Zé de Neco, cuja roda de pedra trabalhava dia e noite esmagando os grãos de milho e produzindo a canjica e o fubá para o consumo diário do sítio.
Era com enorme orgulho que meu pai preparava um balaio, onde colocava cuidadosamente alguns exemplares de cada verdura e legume que colhia ao por sol quando retornávamos para a cidade.
Foi em meio a essa natureza que passei boa parte da minha juventude. Naquela época tudo parecia tão natural, nada passava em minha cabeça além de viver intensamente aqueles tempos, só não pensei que fosse me marcar tanto.
Continuei ligado às plantas, especialmente às flores, elas estavam sempre olhando pra mim onde quer que eu estivesse, pareciam querer me dizer algo, eu as olhava e admirava, era isso que eu fazia, olhava e admirava.
O que será que as flores querem nos dizer com tanta beleza e silêncio? Será que um dia vamos ser flores? Será que as flores algum dia vão ser gente?
Enquanto a resposta não vem, me contento em saber somente que há muito mais do que beleza e silêncio.
Em meio a esse ciclo da natureza, fico intrigado em constatar tanta diferença em gestos tão iguais, ao mesmo tempo em que cavamos a terra para plantar uma arvore e fazemos brotar uma nova vida, depositamos outra, inerte, para o descanso e a transformação.
É nessa igualdade tão diferente que vejo o grande mistério dessa mãe terra que acolhe a semente e faz brotar nas suas entranhas as mais lindas flores, breves, passageiras, mas como nós, vão e vêm e ao chegar trazem essa imensa beleza colorida que enfeita a sua própria face. É como se quisesse trocar o morto pelo vivo, o feio pelo bonito, a tristeza pela alegria, e o inerte pelo balanço que ao sabor dos ventos vai nos ensinando os caminhos desse mundo de Deus.
Renato Paes
Julho 2005
Desde muito cedo percebi que havia em mim uma ligação muito forte com a natureza. Tive a influência de meu pai que sempre cultivou hortaliças nos quintais das casas em que morávamos.
Mais tarde, aposentado, pôde realizar seu sonho de ter um sítio e criar galinhas poedeiras, porcos e uma única vaca, cuja produção de leite era para o consumo da nossa casa. O mais importante, entretanto era a plantação de hortaliças. Ali se plantou e colheu de tudo, alface, couve, beterraba, cenoura, berinjela, tomate, pepino, salsa, além das frutas de estação e de flores que contornavam a estrada de chegada.
Foi nessa época que estive muito ligado ao sítio, e me lembro bem do dinheirinho extra que arrecadava com a venda de caixas de tomate e de verduras.
Lembro também do moinho d’agua construído pelo carpinteiro Zé de Neco, cuja roda de pedra trabalhava dia e noite esmagando os grãos de milho e produzindo a canjica e o fubá para o consumo diário do sítio.
Era com enorme orgulho que meu pai preparava um balaio, onde colocava cuidadosamente alguns exemplares de cada verdura e legume que colhia ao por sol quando retornávamos para a cidade.
Foi em meio a essa natureza que passei boa parte da minha juventude. Naquela época tudo parecia tão natural, nada passava em minha cabeça além de viver intensamente aqueles tempos, só não pensei que fosse me marcar tanto.
Continuei ligado às plantas, especialmente às flores, elas estavam sempre olhando pra mim onde quer que eu estivesse, pareciam querer me dizer algo, eu as olhava e admirava, era isso que eu fazia, olhava e admirava.
O que será que as flores querem nos dizer com tanta beleza e silêncio? Será que um dia vamos ser flores? Será que as flores algum dia vão ser gente?
Enquanto a resposta não vem, me contento em saber somente que há muito mais do que beleza e silêncio.
Em meio a esse ciclo da natureza, fico intrigado em constatar tanta diferença em gestos tão iguais, ao mesmo tempo em que cavamos a terra para plantar uma arvore e fazemos brotar uma nova vida, depositamos outra, inerte, para o descanso e a transformação.
É nessa igualdade tão diferente que vejo o grande mistério dessa mãe terra que acolhe a semente e faz brotar nas suas entranhas as mais lindas flores, breves, passageiras, mas como nós, vão e vêm e ao chegar trazem essa imensa beleza colorida que enfeita a sua própria face. É como se quisesse trocar o morto pelo vivo, o feio pelo bonito, a tristeza pela alegria, e o inerte pelo balanço que ao sabor dos ventos vai nos ensinando os caminhos desse mundo de Deus.
Renato Paes
Julho 2005