DESTINO
Para que chorarmos? Para que lamentamos? Nossas vidas passaram, agora não há mais pressa. Tantos verões, outonos, invernos e primavera passaram. Tantos dias findaram e vieram as noites. Tantas horas devoraram a circunavegação no espaço limitado do relógio sem cessar. Tantas foram as noites sem dormir e sonos sem sonhos. Tantas vezes estendemos as mãos para aparar a água da chuva mas ela escorria entre os dedos. Tantas foram as esquinas que cruzamos com nossos medos, e ainda estamos aqui. É certo que com cabelos grisalhos, com sulcos no rosto e em volta dos olhos.
Em alguns momentos tentamos recordar algo do passado, mas a mente já não é a mesma. Nossas pernas resistem e insistem em nos conduzir e seguir em frente, apesar de dificuldades impostas por artrites e artrose. Nossa visão enevoada já não diferencia neblina de opacidade causada por cataratas ou glaucomas. Nosso tempo encurta a cada segundo. De vez em quando olhamos a janela buscando quem sabe a última visão da beleza do dia.
Estamos no cais esperando... Esperando... Resta-nos esperar a barca do tempo. Nada há o que fazer senão esperar. E no tempo que nos resta tentar viver o tempo perdido.
Pra que nos angustiarmos em reminiscências?
A última primavera passada ficou no tempo, como as folhas do outono que se foram levadas pelo vento para longe. O que restou? Apenas o perfume das flores.
Sinto meus olhos inundados pelo arrependimento do que não vivi. Agora já não dá mais. Não dá mais.
A barca do tempo logo chega. Implacável e pontual.
Não! Não devemos chorar. Apenas dê-me sua mão, encoste-se em mim e sossegue. Espere comigo nossa hora chegar.
Não se importe com as horas que passam. O tempo é inexorável e implacável, então dê as costas para o tempo. Não se apegue ao passado, tampouco ao que você construiu. Tudo ficará para trás. Nada se leva. Nem ouro, nem prata, nem luxo. Apenas o que está no coração.