Nebuloso
Dias cinzas e abafados como uma panela de pressão a explodir em grito, ou implodir em silêncio.
Panela de pressão de pensamentos, de enxaquecas, de gritaria e silêncios ensurdecedores.
Moinho de farelos humanos
Esfarrapados tal trapos ao chão
A limpar a imundície do mundo
E serem pisoteados pelo outro.
Triturador de carne humana
A se aquecerem na fuligem das fábricas
Ou nas carvoarias
A perderem a dignidade
O brilho da face
E as digitais
Perdas sem ganhos
Moradas sem eiras, nem beiras
Sem teto e assoalho
Onde o pirralho
Se sinta seguro pra pisar
Água podre de dejetos
Sinfonia de insetos e pirilampos
Na noite a bailar
Fogos de tiros
Que mata o que sobra
De ar dos pulmões
Lágrimas não há mais
Pois se juntou as inundações
Dos desesperos
Levada nos escombros
Das desilusões
Que amargam no céu da boca
Feito losma pra curar indigestao
Ana Lu Portes, 3 de outubro 2023