🔵 Tribunal inquisitorial
Foi um aparente ato de fé ter como itinerário do catecismo o estacionamento do banco onde aquela turma jogava futebol. Além do curso da Igreja Católica, era obrigatório assistir à missa. Apesar de ser cristão, para um moleque, era uma tortura medieval perder a tarde de sábado.
No começo, eu me dediquei ao questionário bíblico, mas começar a noite de sábado acompanhando um sermão, era muito. Não resisti ao dilema que me fazia sentir uma culpa comparável aos hereges e fariseus, portanto, sacrifiquei a obrigação da cerimônia católica.
A partir do instante que decidiram pela minha expulsão do curso, me senti como algum indivíduo que cometeu alguma heresia diante de um sacerdote medieval ou um papa inquisidor. Contudo, graças à Deus, aquilo não era a Santa Inquisição, aquele clérigo não era o frade espanhol Tomás de Torquemada (o Grande Inquisidor) e aquela construção fazia parte da paróquia guarulhense.
O padre estava imbuído dos poderes de Deus. Então, como o representante do Senhor seguia as Leis do Antigo Testamento, não fui perdoado, fui sumariamente expulso. Esgotadas minhas súplicas, sem argumentos e quase chorando de raiva, melancolicamente me retirei. A minha descida das escadas da igreja, cabeça baixa, acredito que foi observada por uma autoridade eclesiástica assistindo triunfalmente a cena deprimente.
Naquele momento, numa reflexão superficial e confusa, passei a me conformar com o castigo divino. No entanto, fiquei desconfiado que Deus não era vingativo, como falavam. Portanto, sem reunir motivos graves como aqueles punidos com um raio bíblico, uma chuva de rãs ou uma praga qualquer como uma nuvem de gafanhotos, nem sequer o banimento temporário. Pela grandiosidade da existência humana, fiquei convencido de que não seria por tão pouco que eu seria punido eternamente.
No ano seguinte, cumpri os dogmas religiosos, até lá, creio que realizei todas as potencialidades que Deus esperava de mim naquele momento: fazendo gols.