O amigo do Papai Noel.

Todo ano acabo ficando cheio de dívidas. É uma época do ano que o coração abre a carteira.

Presentes e mais presentes, são sobrinhos, pais, avós e uma legião de amigos...

Sem contar é claro, aqueles presentes para manter os laços sociais. Neste ano tomei uma decisão, acredito que incompreensível. Fiz um convite ao maior aliado do Papai Noel.

Marcamos um encontro num bar sobre o pretexto de tomar um chope A principio não acreditei na sua pontualidade.

Inesperadamente ele não só compareceu, como chegou primeiro. Não fiquei surpreso quando percebi que ele já havia feito o pedido. Antecipando os meus desejos recheou nossa mesa com guloseimas; queijos, azeitonas, batatas fritas, pastéis, bolinho de bacalhau e...

Pensei! Ele é exatamente como imaginei. Ansioso, guloso, egoísta, individualista e muito vaidoso. Este era o Senhor Estômago: intimo de Papai Noel. Amigo indispensável: sem ele, o bom velhinho teria menos trabalho e talvez até caísse no esquecimento.

Sentei e pedi um chope! O primeiro gole desceu como se uma lamina de navalha cortasse minha garganta. O assunto seria difícil. Havia me preparado, mas naquele momento, vendo a gigantesca figura de sua excelência o Estômago, a nuvem do esquecimento cobriu minha cabeça, seguida de um frio na espinha.

Criei coragem e mandei a primeira fala!- Sua excelência me perdoe, mas o senhor é um ditador: estou cansado da sua interferência nos valores da minha família.

Ficou louco! Quem lhe deu o direito... Isto é uma ameaça? Perguntou.

-Sim. Respondi com firmeza e mandei o segundo protesto:

-Queremos o direito de escolha!

No Natal que passou o senhor induziu minha filha a trocar o carro de apenas dois anos de uso, por um zero. Atitude que influenciou meu filho e minha mulher. Também não resisti e fiz a troca. E todos nossos automóveis que não tinham mais que três anos de uso foram trocados.

Sua excelência tem consciência de quantas noites passei sem dormir para pagar as prestações.

Voltando um pouco mais no tempo o senhor sutilmente convenceu os membros da família que nossa casa precisava de um reforma total, é claro. Quebraram-se pisos, paredes. Trocamos as fiações, móveis, lustres e até a cama. Sua excelência sabe quanto custou tudo isso. Pegamos as chaves desta casa totalmente decorada, com o melhor da época há apenas cinco anos. Era necessária esta re-decoração?

E em outros natais aconteceram absurdos como pintar toda a casa porque a cor da moda era vermelha.

No natal que vendi ações para comprar aquela joia que pertenceu à condessa de não sei o quê.

É melhor parar. Se continuar recordando vou pedir uma cachaça.

E os aparelhos de telecomunicações, vídeos, celulares, eletrodomésticos. Presentes que duram cada vez menos. Uma vez que são atualizadas em períodos cada vez mais curtos.

Sua excelência não exagera quando estimula nossos desejos?

Tá bom excelência, já entendi não responderá nenhuma das minhas perguntas. Acha que estou delirando. Talvez bêbado! Apesar de ter tomado um único chope e comido apenas um bolinho de bacalhau.

Não tem importância. Ficou claro para mim qual é a sua função social no momento que sentei nesta mesa farta. Sua ansiedade. Sua fome de sólidos e abstratos. Sua boca de hipopótamo. É razão da sua existência! Claro que segundo sua ideologia, que respeito muito.

Mas neste Natal serei o maestro da minha festa. Pedirei ao Papai Noel “somente o necessário, porque o extraordinário é demais para mim“.

Quero na mesa apenas o suficiente para que minha família coma e beba, acompanhados de uma bela música.

Deixarei o espírito fluir com o elixir do amor e reger meus cinco sentidos na direção dos meus semelhantes.

E vou orientar meus familiares para não comprem presentes superiores a 10 por cento de suas contas correntes.

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jaeder wiler
Enviado por jaeder wiler em 23/12/2007
Reeditado em 14/04/2021
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