🔵 Catraca Livre — Direitos estudantis

Era importante penetrar naquele imóvel sem ser descoberto. Definitivamente, eu me senti um infiltrado naquele ambiente inóspito repleto de arquétipos esquerdistas. Na verdade, um criadouro de revolucionários de praça de alimentação de shopping center sustentados por mesada. Os arquétipos que eu encontrei: o amigão com consciência social, a mina empoderada, o estudante de filosofia (que está na USP há uns 10 anos) e o auto-intitulado líder social de apartamento da Vila Madalena (flanelinha de minoria), todos cultivando uma aparência de despojamento de bens materiais.

À distância, é difícil saber se pela lobotomia em sala de aula ou pelo medo de se isolar socialmente, o pagante de pedágio ideológico abriu mão de sua própria personalidade em troca de aceitação. Ali, como num zoológico humano, eu pude ver algo que, ingenuamente, suspeitava não existir mais: o anacrônico jovem comunista. O jovem comunista é obrigado a exercer uma prática apelidada de pensamento crítico. O bonito nome até engana, no entanto, o autoritarismo não permite o pensamento nem a crítica. Em resumo: essa mordaça produz estudantes que não estudam, trabalhadores que não trabalham e pensadores que não pensam.

Hoje, com a sabedoria que só o distanciamento pode proporcionar, posso concluir que aquela paranoia foi despropositada, pois ninguém ali tinha a grandeza de caráter que faz com que suas ideias correspondam aos fatos. Agora sei: naquele bando de idealistas de “playground” não havia um só socialista, aquela aparência era apenas perfumaria, o aspecto Che Guevara de butique era facilmente parcelado no cartão de crédito do papai. Na verdade, a UNE (União Nacional dos Estudantes) só quer o seu dinheiro.

Aquele desfile de camisetas do Che Guevara e bonés do MST poderia ser algum item adquirido na rua Oscar Freire, portanto, sinalizando algo que não basta ser latente. Ou seja, o que atualmente é conhecido como sinalização de virtude. Na verdade, é apenas uma estratégia para não ser cancelado, desmonetizado ou simplesmente parecer “legal”.

Entretanto, a análise sociológica ganhou proporções que beiravam o preconceito e a intolerância. Refratário e decidido a não me tornar um daqueles tipinhos, decidi me concentrar no único objetivo que me trouxe ao QG (quartel general) do PCdoB (Partido Comunista do Brasil). Encarei a fila para me filiar à UNE e obter a carteirinha de ônibus e meia-entrada.

RRRafael
Enviado por RRRafael em 25/09/2023
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