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(Foto pintura do meu lago feita pelo meu irmão)

 

Quando não trabalhamos mais fora de casa, descobrimos tantas coisas para fazer dentro dela. Só que às vezes, falta vontade. Outras vezes, amanheço uma perfeita dona de casa. Hoje é um desses dias. O interessante é que, quando estamos em casa, passamos a reconhecer os sons dos vizinhos. A hora que eles saem, entram, pelo barulho dos passos na calçada ou pelo carro que para. Existem aqueles minutos de conversa jogada fora, algumas vezes aprendemos alguma coisa, outras vezes são conversas inúteis.

 

Meu condomínio é dividido por um lago, e de ambos os lados, percebemos também a vida das pessoas, de uma forma leve.

 

Existe o japonês que faz mantra de manhã, enquanto sua mulher cuida das plantas na área como uma gueixa. Depois, enquanto ele le seu livro, olha para ela com carinho.

 

Em baixo , o velho e sua família. Ele  só vem no verão  e sabemos que ele está em casa quando o cheiro do churrasco atravessa o lago e chega até a nossa área. Percebo como aromas podem evocar memórias e criar conexões entre os moradores. 

Como exemplo,  o cheiro do charuto do nosso bom vizinho Dan. Senta-se na área do nosso lado  com um gato lindo preto e branco, siamês ao seu lado. No pano de fundo, o som de musicas classicas.

As vezes penso que essa cena mereceria a cena de um filme: seus cabelos prateados, a musica, o beleza do gato, o aroma do charuto. E em volta dele, um monte de margaridas amarelas, que ele mesmo plantou.  

 

Na ponta do lago, existe Nancy, uma senhora que com 86 anos ainda trabalha. Benza a Deus! Sai devagar andando pela calçadinha para pegar seu carro. Outro dia deixou cair sua bengala, e corri para ajudá-la e ela não me permitiu. Disse assim: “Filha, obrigada. Mas tenho que aprender a me virar sozinha”. E me deu um abraço. Ah! essa tal independencia americana!

 

Nesse mesmo instante a  menina autista passa voando com sua bicicleta, cantando alto sempre a mesma musica e me acena. Leva no bagageiro um urso de pelucia. Nancy acena para ela e diz: "Devagar Maddie, cuidado comigo!". E ambas sorrimos - um pouco cumplices.

 

Pequenos detalhes que revelam sentimentos e aromas das vidas lá fora.

E os dias correm vertiginosamente. As estações, aqui tão definidas, passam aos nossos olhos como um filme antigo de Glauber Rocha.

Assim como a beleza da sinfonia da rotina ao nosso redor.

Mary Fioratti
Enviado por Mary Fioratti em 20/09/2023
Reeditado em 21/09/2023
Código do texto: T7890008
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