Ferrugem d'alma
A ferrugem é a corrosão do ferro e a insensibilidade, é corrosão da alma. Problemas sempre irão existir_ fato. O grande problema é achar que estamos livres deles, ou, ainda pior: incorporá-los tanto no dia a dia, ao ponto de gerar assim, o próprio problema... cheios de dilemas que nada irão combatê-los ou saná-los. Resta-nos enfrentar e ver até onde irão nos levar. O certo é que aqueles que só "enxergam o próprio umbigo ", são os campeões em colecionar problemas... e ai daqueles que quiserem disputar quem tem mais... irão arrumar um "problema sério " pra cabeça... tem gente que quer sempre estar em "primeiríssimo" lugar nesse "hanking", não podem "perder o posto" para ninguém... bem como não podem emprestar os ouvidos, tampouco serem solidários ou terem um pouco de empatia com os que estão a enfrentar alguma adversidade. Agem como se o universo atuasse exclusivamente contra eles.... incorporando algumas vezes, um vitimismo massante. E usam sempre uma frase de efeito para persuadir e contradizer o outro: " ... isso porque eu não te contei os meus problemas, você nem imagina o que aconteceu comigo essa semana..." e blá-blá-blá... só resta ao ouvinte calar-se, de tão constrangido... guardando para si tudo o que vem enfrentando, para não ter de confrontar com o que está a despejar todos seus problemas.
O lado bom da vida existe... mas não para todos... calma!... não estou fazendo exclusão, explico: quando digo isso, me refiro à forma de enxergar a mesma, falo sobre perspectivas, sobre mudar de ângulo de visão, a fim de enxergar em meio à simplicidade, a tão desejada felicidade. Dias desses, mesmo de longe, pude presenciar uma cena que contextualiza muito bem o que quero dizer; eu vi de dentro do ônibus que tomei rumo à minha casa, vi pela janela (do ônibus e da alma) algo que enterneceu profundamente meu coração... e era belo... e também singelo... genuinamente lindo: Dois moradores de rua se banhando num chafariz em uma das praças da minha cidade. Eles se esbaldavam com aquele momento... como se estivessem em um SPA de beleza... atiravam água pra cima, faziam espuma nos cabelos e na barba, com xampu que certamente devem ter comprado juntando moeda por moeda recolhidas na rua, doadas pelos transeuntes que se sentiram comovidos a doar alguns trocados. Estavam felizes por atingir a meta de poder tomar banho e se higienizarem... ainda que publicamente, ainda que dessa forma... e de quebra, se resfrescarem em meio ao sol escaldante.
E quantos de nós podemos fazer isso diariamente em nossas casas, sem no entanto, com mesma alegria e entusiasmo que eles?... quantos de nós possuímos um teto, um trabalho que nos possibilita levar alimento para a mesa para nos sustentar e a família também (mesmo que a gente não goste do ofício, nem do patrão e nem dos colegas de trabalho)?... muitos de nós perdemos o hábito de agradecer... por ter água encanada, por possuir rede de esgoto, ter uma cama para descansar nossos corpos da labuta diária, ter banheiro e chuveiro para manter nossa higiene pessoal... sem ter de se expor num chafariz em plena praça pública... sem ter de se humilhar centavo por centavo até conseguir com êxito atingir o valor de um simples xampu para lavar os cabelos... quantos de nós não vemos graça em nada, ficamos a murmurar o tempo todo e achar culpados por todas os infortúnios que nos acomete?... quantos estão com o sorriso enferrujado, viraram pessoas ranzinzas e estúpidas... não sabem falar "obrigado, bom dia, boa tarde, boa noite, com licença, por favor... e outras tantas frases que nos permitiria ser mais humanos e mais gentis... mais gratos pelas bênçãos diárias que nos alcança mesmo sem merecimento das mesmas... como um lindo nascer do sol e pôr do sol... as flores multicoloridas que desabrocham na Primavera enfeitando os caminhos, a paisagem... uma chuva benfazeja em dias ensolarados... ar puro e brisa suave... ar que chega em nossos pulmões e nos permite respirar e se manter vivo. Então, vendo essa simples cena em meio a um dia corrido, despertou em mim boas sensações... lembrei que a minha sensibilidade, embora seja interpretada equivocadamente como fragilidade, é o que me permite enxergar beleza onde a maioria não consegue ver mais, é o que me faz enxergar doçura nesses irmãos da praça... e eu quis parar o ônibus para juntar-me a eles... mas fiquei espiando até que a distância e velocidade da condução, fossem afastando essa cena do meu olhar. Que bom que as "ferrugens da vida" não me atingiram ainda!... lógico que nem sempre estou nos meus melhores dias... nem todo dia faz sol, temos tempestades dentro de nós... entretanto, tenho lubrificado minhas "engrenagens"... com olhos marejados e emocionados... sem esperar um motivo para encantar-me... tem funcionado!