A CLANDESTINIDADE.

A mais sórdida condição de vida é a clandestinidade que por vezes é exitosa em variadas gradações. Faz imenso mal ao clandestino e ao entorno de sua vida a clandestinidade de sua obra. Por ela vive-se no porão da vida, sombrio, excomungado de possibilidades de reconhecimento historiográfico se algo de bom pode-se criar ou considerar. Cedo ou tarde surgirá mais forte que o silêncio e a dissimulação. Mas os clandestinos, além de não terem nome, quando usam algum sinal, valem-se de hipocorísticos, apelidos, pseudônimos, todos sem nenhum significado sinalagmático e, evidentemente, quem está impulsionado pela clandestinidade, nada pode criar que valha como ponderável e aproveitável, mesmo se existe criação e, quando muito, trazem nas suas limitações conturbações contraditórias que pode se compreender no quadro da deseducação.

São o sabor azedo de suas vidas amargas, isoladas e intimistas mesmo se públicas, bloqueadas de qualquer acesso. Vivem no medo, por medo e pelo medo da luz que varra a escuridão e traga a real verdade, por ser a covardia a bandeira hasteada. Não conhecem suas origens ou têm medo e delas se envergonham. Qualquer aproximação social verdadeira, depositária de sinceridade, é repelida por total falta de condições de sanidade intelectual. São esses piratas primevos a última escala do mata-borrão da lógica, nada assimilam ou entendem. Levam o séquito de suas nulidades que a vida delegou, arrastadas junto aos seus limitadíssimos critérios assentados em poucos neurônios, incapazes de entenderem o curial.

Se arrastam nas vielas da vida dando à publicidade testamentos de suas frustrações e complexos, que o observador arguto pinça de seus sinais expostos. Colhem confrontos que levam ao isolamento da realidade e, finalmente, à condição de eremita de aplausos pretendidos. Não têm perfis de transparência para viverem em sociedade. Não suportam a possível retórica que desnuda suas personalidades ocultas e paradoxalmente visíveis, e que fazem sucumbir a discussão de dogmas que não conhecem, e mesmo assim falam professoralmente de cadeiras anãs, quando se pensam sentados em arquicadeiras. Não há eco de prestígio, mas repulsa uníssona.

Se conseguem dar um passo a frente saindo do insucesso, mostram essas “qualidades” do inferno em que vivem, “intra muros”, esmagando até mesmo coletividades, como a frequentar todas as “bolgias” de Dante Alighieri em seu “Inferno”. Assim tangenciam a hecatombe espiritual para quem do espírito se apossa e conhece, e se conscientiza.

Se conseguem algumas migalhas materiais, lhes chega do indevido, e viram pavões do nada, embora habitem lugares insalubres de ética e viciados, fazendo ufanismo do que não têm, a moeda mais importante, a franqueza da conduta hígida.

Nos servem como parâmetro do não-ser na equação shakesperiana de Hamlet. Nada pior do que não ter nome, não ter identidade, não conhecer suas origens no avitismo, o que o destino negou, e por isso, não conhecer de onde veio e quem o trouxe. Por isso espalham seus complexos em condutas risíveis, quando por acidentes históricos atingem enganosamente lideranças de mando de todos os matizes, em épocas primevas e contemporâneas em diversos espaços.

Estão gravados na história muitos holocaustos de variadas formas e meios. Basta focar a lupa sem paixões no leito da imparcialidade.

Existe visão alargada para todos, favorecida e aumentada inteligência pelos que distinguem esse cenário critico, compreendendo essas dificuldades de viver sem origem e tradição. Mas é necessário que saiam de seus porões esses personagens multiplicados em nossos dias, e confessem suas danosas posições vividas e ainda vivendo, sem o que a alternativa será vagar como vagou Caim pela sentença divina primeira, de viver muito para expiar suas culpas.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 16/09/2023
Reeditado em 16/09/2023
Código do texto: T7886725
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