Refletindo sobre a criação
Criação, palavra de tantas vertentes e significados, que, contudo, convergem para alguma espécie de dinâmica ou ação. Criação, junção de criar+ação. Passamos a vida criando situações, trabalhos, ideias, técnicas, conceitos, estilos variados de arte, filhos, animais domésticos, embora também exista gente nociva que atravessa a vida sem criar nada além de caso, desarmonia, escudando-se em alguém a quem explora, sem jamais dar a perceber, logicamente. Aliás, se um filho é considerado malcriado não importa necessariamente que os pais não o orientaram bem, e sim que o rapaz pode ter decidido seguir seus impulsos, índole, enfim, usou seu livre-arbítrio de um modo duvidoso.
Certo é que a criação importa na geração de algo a partir do vazio, do nada, por isso muitas vezes é expressão sinônima de invenção. A criação do mundo, por exemplo, gera polêmica por motivos religiosos visto que, enquanto os seguidores de algum credo afirmam que o mundo foi gerado por centelha divina (Adão e Eva, para exemplificar a doutrina cristã) outros creem apenas no Big Bang, uma explosão cósmica que haveria dado origem ao Universo. Ocorre que até mesmo alguns cientistas creem que Deus é o responsável pelo Big Bang, portanto a questão é subjetiva e complexa ao extremo.
Como não poderia deixar de ser, as verdadeiras criações, aquelas boas e inéditas, constantemente sofrem transformações ou modificações por pessoas inescrupulosas que visam tomar para si o crédito de uma obra ou invenção bem-sucedida geradora de riqueza. Ora, tais atos jamais serão melhorias nem homenagens, são apenas plágio. A fim de não recair na ilicitude, haveria que se obter permissão do criador para então modificar a obra, ampliá-la , aperfeiçoá-la e auferir lucro com o produto obtido. No mundo cor-de-rosa e ideal (e irreal) dessa forma tudo transcorreria em paz, porém o que se observa é a infração às normas vigentes e a obra copiada recebe, no máximo, uma nota mencionando que serviu como “inspiração”. E a cópia, lógico, é uma “releitura” sem qualquer crédito que enseje o pagamento de direitos autorais. Se é possível ser genial sem ineditismo, eu desconheço, que o diga Leonardo da Vinci, polímata maior, inventor de objetos e mecanismos tão inéditos no Século XVI que agora, quinhentos anos após a sua morte, alguns deles nem foram decifrados ainda.
Sinceramente julgo que o cientista francês Lavoisier, ao elaborar seu conceito segundo o qual “na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma”, não pretendeu regulamentar o plágio (risos), apenas referiu-se a fenômenos químicos que observou em seus estudos. O povo costuma distorcer conceitos legítimos partindo de premissas verdadeiras para desembocar em conclusões falsas, com isso Lavoisier não contava. Injustiças à parte, há quem não considere Santos Dumont como o criador do avião, e sim os irmãos Wright. E a lista de criações que ensejam debates é infinita, cada qual puxando a brasa para a sua sardinha.
Sempre haverá mentes brilhantes que impulsionam o mundo com o vanguardismo de suas criações e um bando de aproveitadores à espreita, mas se chegamos até aqui com um arsenal científico e tecnológico maravilhoso capaz de controlar o avanço de doenças e de minorar desigualdades ancestrais, é sinal que, apesar de errarmos muito, ainda vale a pena perseverar e criar. Criar esperança.