Não quero!
Não sou obrigado a aceitar tudo. Eu descobri isso recentemente e fiquei tão maravilhado com essa descoberta óbvia, que me senti até capaz de escrever uma crônica. Eu disse não quero. Não aceito, isso não me fará bem. Sabe, dizer isso foi como fazer um carinho em mim mesmo. Acho que não conseguirei explicar para vocês. Ao tomar essa atitude me vi dividido em dois, em que um, o meu ser condicionado a aceitar tudo, sentia-se amado pelo meu ser que disse não.
Não irei relatar especificamente o fato que me levou a tomar essa decisão, pois acredito que não seja relevante. Inúmeras vezes na minha vida o não me era útil, o não, era inclusive, a única maneira de me preservar, um ato de autocuidado. Porém, eu quase sempre dizia sim. Por razões diversas, como acredito que seja a realidade de muitas pessoas, talvez até, caro leitor(a), a sua própria realidade. Eu acreditava não ter escolha, sem perceber que aceitar tudo de todo jeito, era uma escolha. A pior escolha, visto que eu era sempre o mais prejudicado.
Então, o que aconteceu que me fez mudar? Um olhar para mim mesmo. Só isso. Olhei-me calmamente, eu estava bagunçado. O cansaço se misturava com o estresse. Meu bom humor havia se perdido em meio a tantas tralhas emocionais que eu havia acumulado. Que imbecil! Exclamei para mim mesmo durante essa visita que me fiz. Não gostei daquele ser confuso. Fiquei indignado quando vi guardadas em uma gaveta empoeirada tudo o que me fazia feliz. Vale a pena viver assim? Perguntei-me. Uma pergunta retórica.
Deitei-me olhando o teto opaco de meu quarto. Vale a pena viver assim? A pergunta continuava ecoando na bagunça emocional em que eu me encontrava. Não, eu não sou perfeito. Mas até um cachorro malcriado merece um passeio num fim de tarde. Eu posso até merecer todo esse caos, falei para o teto opaco que me encarava, mas não quero. E a magia começou nesse instante, eu descobri que o não querer é poderoso. Tem consequências não querer, não aceitar? Sim, muitas. Mas nada comparado as consequências de não viver. Eu quero viver! Dizer isso em voz alta foi incrível.
Comecei no outro dia, educadamente. Eu não quero mais ocupar esse cargo. A resposta que me deram foi uma pergunta: por quê? Você é tão bom fazendo isso. Olhei para dentro de mim, a bagunça era de arrepiar. Eu sabia que até podia ser bom fazendo aquilo, mas bom para quem? A única pessoa que gritava pelos meus cuidados, estava abandonada. Então, respondi que simplesmente não queria. E deixei que o meu querer ou o não querer aquilo fosse suficiente.
Agora, graças a eu ter dito não é que consegui tirar do fundo da gaveta empoeirada esse tempo para fazer o que amo, escrever. E estou escrevendo porque eu quero. Sei, é óbvio, que terei muitas vezes que fazer o que não quero. Todavia, jamais deixarei minha casa bagunçada novamente. Todos os dias irei arrumá-la. Não sou obrigado a aceitar o que me faz mal. Posso perder alguma coisa com minhas recursas? Sim, várias. Desde que eu não me perca de mim mesmo, eu não me importarei com o que ficar pelo caminho. Terei a certeza de que quando eu voltar minha casa estará confortável, pois é em mim que eu habito.