A confissão
Márcio nasceu em uma família de classe média baixa, na periferia da zona leste. Cresceu jogando futebol e frequentando a escola pública local.
Márcio gostava de estar no centro das atenções. Era simpático, solícito e a puberdade o transformou em um jovem atraente. Chamou muito a atenção da comunidade, ao participar da catequese para o Crisma, na sua paróquia.
Daí, foi um passo para tornar-se acólito na missa dominical, a liderar o grupo de jovens e a atrair um bando de mocinhas que iam à missa para vê-lo. O povo achava que estavam buscando a Jesus, mas estavam contemplando Márcio.
Era da índole do Márcio ocupar o centro do palco com seu olhar piedoso e pidão. Ao terminar o ensino médio, fez uma experiência vocacional, cursou o Propedêutico, depois Filosofia seminarística e, por último, Teologia.
Até o curso de Filosofia, Márcio fora visto aos namoricos; na Teologia, abraçou o celibato e a abstinência. Diziam que Márcio faria sucesso na igreja porque tinha “jeito de hominho”. Muitos estavam certos de que ele tinha vocação.
Sua primeira sensação de poder veio quando foi sagrado Diácono. De servo fiel passou a agir como um candidato a capataz. A coroação veio na grande cerimônia, quando Márcio foi sagrado sacerdote pelo Arcebispo.
Pe. Márcio continuava simpático e comunicativo, mas suas habilidades para fazer política manifestavam-se. Ele sabia como explorar sua voz grave e seu corpo sensual para seduzir fiéis a fazerem doações generosas.
Quando completou cinco anos como padre, Márcio já não era mais religiota. Não acreditava em mais nada do que fazia, mas mantinha as aparências, porque era assim que as coisas funcionavam na igreja.
Márcio vivia em uma ótima casa paroquial, com ar-condicionado, internet e TV a cabo, carro, faxineira e cozinheira. E recebia salário e doações pessoais.
Muito contrariado, foi atender um homem, na sua idade, que insistiu em se confessar na sacristia. Quem ainda dava valor ao sacramento da confissão?
Ao vê-lo, Pe. Márcio transfigurou-se. Conversaram, tornaram a encontrar-se e nunca mais se separaram. Oficialmente, eram bons amigos fraternos.
Só os mais próximos da comunidade paroquial sabiam da verdade verdadeira.