OUVIU DIZER OU OUVIU FALAR?
Francisco de Paula Melo Aguiar
Para início de conversa é importante mencionar que os cangaceiros: Lampião, Antônio Silvino e Corisco, dentre outros igualmente importantes, não exerceram no seu tempo de atividades, perversidades e "bondades" a ideologia de destituir ou tomar o poder político do Estado. Eles eram bandidos de empreitadas e sem objetivos políticos, isso mesmo, não contestaram o governo constituído em nada. Não se tem provas que eles contestassem o governo e muito menos sua forma de governar e de distribuir sua renda em qualquer parte do Brasil e principalmente no berço do cangaço, o nordeste com suas secas perenes, o povo pobre morrendo de fome e sede, sem eira, beira e tribeira. Época muito carente, pior em milhares de vezes do que os dias atuais, porque naquele tempo a indústria da seca era patrocinada pelo governo central em favor dos coronéis e latifundiários sertanejos ou não, quando da construção de açudes em suas terras, bem diferente dos dias atuais, onde o velho rio São Francisco, pinga aqui e acolá por onde passa a transposição como transformiga.
Por outro lado, não se encontram em jornais, revistas e livros da época um só til ou uma só passagem da prática de guerrilha promovida pelos cangaceiros nordestinos, comandados por Lampião e ou não, pelo menos uma só vez se quer para se fazer um "chá ", no dizer do português "oxente" do cabra da peste.
Por outro lado, também não se encontram nos jornais, revistas, documentos outros que comprovem que o cangaço aqui praticado tenha tido envolvimento de qualquer espécie em defender o povo oprimido do cambão ou do boia-fria da época, nem algo parecido, ainda que por analogia ao MST - Movimento dos Sem Terra, etc, dos dias presentes e ou de mera semelhança com Antônio Conselheiro e seus seguidores, em Canudos, segundo o relato de Euclides da Cunha, em Os Sertões.
É fato, em escritos oficiais e oficiosos, encontramos documentos, dizendo que os cangaceiros e apaniguados, usando a própria força pública, a polícia da época, de quem o cangaço comprava armas e munições, uma vez que isso vem corroborar com a ideia real, nua e crua de que o cangaço defendia os interesses dos coronéis e senhores de terras e do domínio político local, regional e nacional.
Assim sendo, o cangaço de Lampião e seus cabras, funcionava como instrumento do quero, do posso e do mando para intimidar os oprimidos e famintos no Nordeste do Brasil e não a favor do povo pobre e invisível daquele tempo como erroneamente se pensa.
A humanidade sabe que onde o poder político e da religiosidade falha em sua dominação e intimidade do céu para os bons e do inferno para os maus, aqui representados pelos fracos e oprimidos, a força bruta do cangaço, assim como a fogueira da Santa Inquisição e recentemente do pau de arara, resolveria o problema a favor dos dominantes contra seus dominados.
Não são poucos os livros de História do Brasil que contam em versos e prosas, inclusive os folhetins de cordel que tratam e contam o imaginário popular da década de 20 e do início da década de 30 do século XX, sobre o caso da "Coluna Prestes" que ideologicamente pretendia tomar o poder político no país. E essa coluna passou pelo Nordeste também, esteve na Paraiba, onde a principal vítima foi o líder político e padre Aristides Ferreira da Cruz, sangrado vivo no dia 9 de fevereiro de 1926 na cidade Pianco/PB pela Coluna Prestes, que morreu heroicamente e não se entregou, enquanto isso, tempos depois, o Padre Cícero Romão Batista ( o santo do povo nordestino e em breve será canonizado pela Santa Sé), igualmente líder religioso e político, recebeu ordens do governo federal para se encontrar e se encontrou com Lampião e seus cabras, com quem fez um acordo público e notório para enfrentar a Coluna Prestes.
É assim de se concluir a "olho nu" que o cangaço não praticava guerrilha, porém, praticou em larga escala o banditismo social no Nordeste, cuja região era e continua sendo marcada por mandos e desmandos do quero, posso e mando por parte da elite sem compromisso com os sem nada, sem emprego, sem comida, sem água para beber, sem teto, etc, herança maldita de quase quinhentos anos de escravidão visível, porque o 13 de maio de 1888 ainda não se concretizou.
As mazelas de Casa Grande e Senzala, escrita por Gilberto de Melo Freyre, ainda não foram extintas.
É pura lenda dizer que Lampião, Antônio Silvino e Corisco e todos demais cangaceiros defendiam a pobreza nordestina e que eles foram como foram brutalmente assinados porque defendiam os sem nada do Nordeste, ledo engano, eles foram assassinados porque Getúlio Vargas, o pai dos pobres e a mãe dos ricos, entendeu que na sua ditadura do Estado Novo, quem mandava era ele e não precisava mais da ajuda do cangaço e bem assim de Coiteiros, segunfo o ramance escrito pelo parabano José Américo de Almeida.
E há quem afirme que no Brasil, desde o seu desenvolvimento ou achamento, quando o pobre incomoda por algum motivo, a ordem é matar para o descarte social, assim como foi com os povos originários (indios), com os líderes da Cabanagem (Grão-Pará , 1835 e 1840), com os chefes da Balaiada (Maranhão, em 1838 e 1841), com os escravos, com Antônio Conselheiro e seus seguidores ( na primeira República), com Lampião e seus homens ( na segunda República ou Estado Novo) e continua com as incursões nas favelas ou comunidades das metrópoles, grandes e pequenas cidades sem políticas públicas para enfrentar as milícias oficiais e as milícias oficiosas em combate ao tráfico e ao instituto bandido da bala perdida.
O cangaço não tinha ideologia de defender pobre, vivia as custas dos coiteiros e a serviço deles, também não queria o poder político para dominar porque tinha a cobertura de quem dominava.