Havia um buraco no meio do caminho
Houve um tempo em que andava por uma rua e sempre me impressionava com um bueiro aberto. Era tão fundo que eu não conseguia enxergar seu fim, só ouvia o barulho da água perdendo-se dentro dele. Bafejava ar quente como se estivesse vivo e engolia tudo como se tivesse fome. Lembro de sempre impressionar-me com a majestade do buraco e com majestade, quero dizer tamanho e periculosidade. Um deslize e "era uma vez eu". Isso dava medo e por isso eu ficava mais atenta a tudo ao redor.
Não sei bem ao certo como, mas houve um dia em que eu andei e não percebi o buraco, só notei que já havia passado dele. Não sei se era preocupação, se estava muito atrasada ou se simplesmente o pasmo é algo que vamos perdendo com o tempo. Só sei que naquele dia, o buraco no meio do caminho foi como as pedras de Drummond:
Havia um buraco no meio do caminho.
No meio do caminho, havia um buraco.
Um daqueles problemas chatinhos e cotidianos que de tão repetitivos e banais, perdem sua importância, e portanto seu poder.