Despertar
Sou filha de um tempo que não volta mais... um tempo que se perdeu nas tramas do tempo. Mães sentadas nas calçadas enquanto seus filhos brincavam seguros e livremente nas ruas. Mas o meu saudosismo é complacente, não visa lamentar o tempo presente e glamorizar apenas o passado. É apenas uma referência, talvez uma comparação, quem sabe uma reflexão para elucidar o momento atual. As "engenhocas eletrônicas" perderam seu propósito principal: permitir ao homem ter mais tempo, contando com o auxílio das máquinas para otimizá-lo. E nunca sentimos com tanta intensidade a liquidez do mesmo... como bem retrata nosso contemporâneo polonês, sociólogo, escritor, filósofo e professor:
Zygmunt Bauman, em suas belíssimas obras deixadas ( morreu em 2017), que possibilitam melhor essa reflexão. Recomendo muito a leitura de seus livros. Temos comprovado isso: calendário vem e vai... antes mesmo que possamos nos dar conta da noção de tempo... a semana passa veloz, outra chega no mesmo ritmo... "lamentamos " a segunda feira, ansiamos pela sexta feira... as estações mudam sem que aproveitemos as "tendências da moda" e da temporada... sem relaxar e se desprender dessas "imposições" da sociedade, que deixa tudo mais pesado e também causa exclusão ... adoece!... presos em "modismos", "achismos" e outros "ismos"... inertes por procrastinação, insatisfeitos por efeito de massificação, " resmungões" por vocação. O Natal chega em Setembro no comércio_ pasmem -se!_ com vendas de "apetrechos " , artigos que remetem a data, todos se antecipam para garantir os enfeites Natalinos, a comida fica para a última hora. Passada a data, já se concentram no Ano Novo (que de novo, só tem o número): onde passar a virada de ano, que roupa e cor usar, o que comer... "dilemas" que se repetem e sucedem ... de novo e de novo. E não me excluo dessa reflexão, agimos por vezes feito formigas no formigueiro, com ações padronizadas para manter o "equilíbrio" do mesmo. E isso é a vida, ou pelo menos um resumo do que tem sido... um olhar pessimista ou realista?... sei lá... eu acho que a única forma de trazer vivacidade, pois a vida pulsa, é concentrarmo-nos no agora, agarrá-lo como se fosse nosso último instante, sair das "janelas das distrações "... que são muitas... e estão todas maximizadas para prender a atenção e "robotizar" nossas ações. Não dá mais para caminhar sem noção. É hora de sair do "transe" e a-cor-dar!... sair do tom cinza, colorir a vida, sair das calçadas do mundo liquefeito e voltar para a morada interna. Se tem uma grande lição a ser tirada do passado, é que ao sentarem-se nas calçadas para vigiarem seus filhos brincando, as mães já haviam cuidado da "casa"... interna e externa... e lhes sobrava tempo para papear e vê-los brincar. Quando foi que isso tornou-se luxo ou um "sonho " distante e delirante?... só sei que depois de sonhar, é hora de despertar. Nesse caso, já estamos atrasados.