🔵 Jornalzinho da Vila Galvão
O jornalzinho da Vila Galvão era uma publicação simpática aos moradores do bairro, porém o nefasto intuito era eleger seu dono, o eterno vereador. Para mim, era a oportunidade de parar numa padaria ou boteco para comer alguma coisa, ganhar alguns trocados, dois sanduíches de presunto e queijo e uma lata de guaraná.
Para realizar essa troca justa, era só eu fornecer a minha incipiente força de trabalho, arremessando exemplares nas casas, prendendo nos para-brisas dos carros e entregando aos transeuntes. Assim, a população ficava informada das fofocas, dos óbitos e do mundo das subcelebridades locais; o vereador impulsionava sua candidatura; e eu mudava meus hábitos alimentares no recreio escolar, pois eu sabia que seria promovido da fila da sopa para a cantina.
Saímos para divulgar as inutilidades da nossa aldeia com os ameaçadores capangas do candidato. Sim, o postulante à vereança de Guarulhos, além de dono do jornalzinho, era um tipo de chefe da máfia local.
Pois bem, com uma proteção supostamente armada íamos divulgando as amenidades da periferia guarulhense. Os mais preguiçosos ou desonestos descartavam volumes generosos em terrenos baldios e bueiros. Como se Deus ou os capangas estivessem vendo, eu entregava as edições religiosamente, temendo os castigos divinos e com medo de ser uma vítima da dupla de agentes da justiça paralela.
Do alto dos meus onze anos de idade, um par de sanduíches de presunto e queijo e uma lata de guaraná valiam todo o esforço de espalhar algumas páginas recheadas de propaganda politica. Além disso, o pagamento em dinheiro garantiria o acesso ao mundo maravilhoso das guloseimas escolares.
Enfim, a precoce vida laboriosa, na modalidade “manhã de jornaleiro” seria recompensada, na aula antes do intervalo, com o cheiro de esfirra que aguardava a minha fome. Essa expectativa era muito mais forte que o resultado: mão preta, suja da tinta do jornal.
O jornalzinho da Vila Galvão não existe mais, nem o candidato/vereador, mas eu me lembro bem de quando eu difundia as notícias de falecimento, fofocas e colunas sociais. Nas casas, nos carros e de mão em mão.