RELEMBRANÇAS
MARIA BELA DOS PRAZERES. Este era o seu nome. Eu a conheci e posso dizer que fazia jus a ele. Era de fato bela e os prazeres, afinal, lhe deram muitos filhos, entre os quais minha mãe, Conceição, que herdou os mesmos atributos. Vaidosa, Maria não saía de casa sem borrifar o corpo com o perfume da época, Espelho Mágico, se não me engano.
Sortudo foi meu avô, Mariano, que ganhou o coração da beldade, vencendo a concorrência. Casaram-se e ficaram sob o mesmo teto pelo resto da vida, no interior de Minas.
Sim, Maria Bela dos Prazeres, que hoje repousa no leito celestial, juntinho com o marido, é minha avó materna e ainda embeleza minhas lembranças dos tempos de menino. E, além dos atributos carimbados no próprio nome, tinha outra qualidade: era muito espirituosa e apreciava uma piadinha de duplo sentido. Sabendo disso, eu e meu irmão gostávamos de provocá-la. Lembro que, já idosa, quando perguntávamos seu nome, a pretexto de testar-lhe a memória, ela respondia sem vacilar: Maria Bela. Mas, vovó – dizíamos – e os prazeres? Ah... esses já acabaram há muito tempo, respondia com um risinho sapeca.
E por que estou lembrando isso agora? Primeiro porque, revirando gavetas antigas, deparei com uma ficha cadastral, ainda escrita à mão, contendo o nome dela. Como esquecê-lo? Segundo, porque acabo de saber que Al Pacino, com oitenta e três anos, vai ser pai novamente. Talvez ainda sob a inspiração do filme Perfume de Mulher, o veterano ator recarregou suas baterias para dançar, abraçar e amar, mais uma vez, ao som de Por Una Cabeza com uma linda moça que, em outros tempos, poderia ter sido minha avó. Ela também – sempre bela e perfumada - seria capaz de reacender as chamas de um octogenário, há muito apagadas, sem o reforço do comprimidinho azul.
Al Pacino, nessa idade, será pai e avô simultaneamente. Dupla e abençoada missão. Quem sabe, na vida real, O Último Ato (outro filme seu)? Agora, vai ter de se desdobrar. E, pela lei natural que rege o mundo e as pessoas, não vai poder usufruir desse privilégio por muito tempo. De toda forma, aqui do meu cantinho, eu desejo a ele plena felicidade com o novo amor e completa realização em torno da anunciada paternidade. Que há de ser bela e com muitos prazeres, para lembrar minha avó e os versos de Vinicius de Moraes:
“E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive,
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.”