A TERRA É PLENA

“A TERRA É AZUL” – E PLENA

Nelson Marzullo Tangerini

Um dia desses, alguém publicou no Facebook que não devíamos nos preocupar com os tremores da Terra porque o Planeta estaria se contorcendo e voltando a ser redonda, depois de ser plana durante os últimos quatro anos.

Aliás, nesses últimos quatro anos, Gagárin, que declarou, maravilhado que a Terra era azul, talvez tenha passado essa temporada de desiquilíbrio mental se remexendo dentro do túmulo, assim como os astronautas americanos do projeto Apollo que consolidaram a conquista da lua.

Não querendo entrar em conflito com terraplanistas, que já estavam juntando gravetos para alimentar a fogueira da nova inquisição, resolvi trazer à luz da sabedoria, a luz sugerida por Platão, o soneto “A Terra”, do saudoso poeta Nestor Tangerini, publicado na p. 13 da revista “Vida Nova”, Rio de Janeiro, DF, Natal de 1943, e que fez parte do livro de sonetos satíricos Humoradas..., Editora Autografia, Rio de Janeiro, RJ, 2016, pois ele nos mostra que a discussão é mesmo antiga:

“Alguém, nas priscas eras, figurou

a Terra qual se fora uma fritada;

a um queijo Anaximandro a comparou,

sendo a face inferior desabitada.

O velho povo hindu a imaginou

a tampa, em concha, de formosa empada;

e o sábio Tolomeu a consagrou

formidável tomate de salada.

Depois, como Apiano a concedera,

viu Colombo que a Terra era uma pêra.

Mas – que é laranja – dizem por aí.

Eu, porém, ‘abafado’ em meus ‘problemas’,

Nos quais aplico todos os sistemas,

Acho que a Terra é um grande ‘abacaxi’ “.

Sim, a Terra é, realmente, um grande “abacaxi”, pois, além de convivermos com desastres ecológicos provocados pelo próprio homem, temos de conviver com cavalgaduras que se recusam a evoluir intelectualmente, bem como aceitar que o pobre tenha uma residência humana, que estude, coma, viaje e tenha uma vida digna como a dos ricos. Além do mais, ignorantes e gananciosos, são desprovidos de estudos de Antropologia: negam, também, que os povos originários vivam em suas terras - e que seus direitos sejam garantidos. Da mesma forma é assustadora a vida dos quilombolas, cujos antepassados, africanos, foram escravizados e jamais indenizados pelos “senhores”, esses, sim, invasores de terras.

De sua cela, em Realengo, onde Gilberto Gil também esteve preso pela ditadura militar que essa caterva quer de volta, Caetano Veloso escreveu – se encantou e cantou - a Terra em sua forma plena, redonda, azul, humana e livre dos tiranos.

Enquanto, em plena Guerra Fria, se temia que fosse a Terra se tornar vermelha, Gágarin, um astronauta russo, de um país até então comunista, declarava que a Terra era azul. Enfiar isso na cabeça daquela galera verde-oliva, obtusa, era um ato de temeridade.

Obrigado, Galileo Gililei, por peitar os religiosos negacionistas, afirmando que a Terra é redonda. Plagiando o poetinha, que seja redonda enquanto dure!

Nelson Marzullo Tangerini
Enviado por Nelson Marzullo Tangerini em 02/06/2023
Reeditado em 09/06/2023
Código do texto: T7803606
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2023. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.