A CACHAÇA QUE OCULTOU A CHAVE DE CASA
Muitos não acreditam na máxima “todo bêbado é um palhaço”. Sou testemunho vivo para dirimir qualquer dúvida que ainda paire sobre esta grande verdade.
Era mês de julho e as crianças em férias da escola, estavam na casa dos avós, no interior. Tudo conspirava a favor.
Dezenove horas e eu acabara de deixar a esposa no hospital, era dia de plantão dela. As sete da manhã viria buscá-la. Na volta pra casa, parei num supermercado e comprei um “celular” de caninha do engenho. Em casa, ouvindo músicas, tomaria uns goles enquanto esperava o sono dar sinais da hora de dormir.
Só percebi quando peguei o celular para tomar mais uma dose e ele estava vazio. Demorou pouco e logo senti o organismo reclamar sua insatisfação. Queria mais álcool. Lembrei que no centro da cidade estava acontecendo o ZOOEIRA. Uma festividade local, vários dias de muito rock que tinha mais a ver com minha praia. Na semana anterior, o FORRÓ FOLIA, mastruz com leite, aviões do forró e outras. Mas não tinha participado de nenhuma noite. Não gostava.
Com a intenção de unir o útil ao agradável, tomei um banho, vesti uma roupa, montei na moto e fui para o centro da cidade. Sabia do ciúme e da valentia da companheira com quem convivia. Daquelas que só param de reclamar quando começava a faltar o fôlego. Se não havia um motivo justo, reclamava do sofá fora de lugar, do vento mexendo com seus cabelos. Uma figura! Mas eu gostava do risco, da adrenalina.
Estacionei a moto junto ao meio fio da praça de eventos e coloquei a chave da moto junto com a chave de casa naquele bolso pequeninho que tem nas calças jeans. A noite é longa e o estado que retornaria pra casa era uma incógnita. A noite super animada, muito rockroll e para completar, encontrei com o Rafael, trabalhávamos juntos na agência do IBGE local, e outros amigos. Daí pra frente, preferência com a bebida não exista, a que viesse, descia.
Quase três da madrugada e não havia mais espaço no corpo para espalhar álcool. Rafael no mesmo estado e pediu-me para deixá-lo em sua casa. Bêbado não tem mesmo noção do perigo! Tirei a chave da moto do bolsinho e a de casa, coloquei em outro bolso da minha roupa.
Dos três o único sóbrio era a moto. Embora quem estava nos vendo passar, era fácil perceber pela forma que eu dirigia, que a moto estava completamente embriagada. Ela seguia fazendo zigue-zague pelas ruas. Mas, chegamos. Rafael desceu da moto, entrou em casa e eu fui para a minha.
Morava num conjunto habitacional criado recentemente, muitas casa ainda em construção. Na esquina, chegando em casa, havia uma construção, um pequeno monte de areia onde eu tinha que fazer uma pequena curva e caímos, eu e moto. Levantei a moto e empurrei uns vinte metros até a calçada de casa. Meti os dedos no bolsinho para pegar a chave de casa e abrir a porta. Nada de chave. Procurei em todos os outros bolsos da calça, nada. Pensei: a chave saiu do bolso na queda, ali na areia. Caminhei até lá e com dedos das mãos em forma de rastelo passei a procurar pela chave. Não achei. Novamente pensei: pois caiu lá na praça quando tirei a chave da moto do bolso. Isso mesmo, voltei mais de dois quilômetros e parei no mesmo lugar da praça. Liguei a lanterna do celular procurando e nada. Passei a andar pela praça sempre olhando pro chão e outra vez veio a ideia da chave ter caído mesmo, lá na areia. Voltei!
Na hora de fazer a curva, novamente cai na mesma areia. Levei a moto até a calçada de casa e fiz outra busca mais apurada na areia a procura da chave. Não encontrei e pior, começou a bater o desespero, já pensando na briga e numa primeira e merecida surra. Lembrei que dentro de casa tinha uma chave reserva, mas as paredes eram altas e não tinha como subir no telhado.
Pensando em todas as possibilidades de evitar que a mulher soubesse que passei a noite foliando e evitar dissabores. Subi na calçada e encostei na parede da frente, cruzei os braços sobre o peito e pasmem: senti algo dentro do bolso da camisa que, durante toda essa aventura, nunca lembrei de sua existência. Era a chave!
Peguei a chave joguei na calçada e comecei a pular em cima, na intenção de esmagar mesmo. Parei dizendo pra mim mesmo, devo é agradecer de tê-la encontrado. Abri a porta, coloquei a moto para dentro, escondi a roupa que estava vestido toda suja de areia, tomei um banho e para dormir mais tranquilo, coloquei o relógio para despertar vinte pras sete. Vinte minutos era suficiente para levantar e ir buscar a mulher no hospital.
Acordei assustado ouvindo murros fortes na porta e gritos chamando pelo meu nome. Ainda desnorteado da embriaguez, sentei na cama e olhei para o despertador: 8:30 da manhã. E adivinhem quem estava esmurrando a porta e gritando meu nome?